Paradigma do Laudo Pericial – CPC/2015

 Prof. Me. Wilson Alberto Zappa Hoog

 

Resumo:

    Em razão da importância do CPC, Lei 13.105, com vigência a partir de 18 de março de 2016, foi instituída a figura do paradigma do laudo pericial, motivo pelo qual apresentamos uma breve análise sobre o paradigma do laudo constante no CPC/2015, art. 473. Envolvendo o objeto da perícia, análise técnica ou científica, a utilização de método científico, e a fundamentação das respostas.

 Palavras-chave: Paradigma do laudo pericial. CPC/2015, art. 473.Objeto da perícia. Análise técnica. Análise científica. Perícia Contábil. Laudo pericial.

Desenvolvimento:

    Inicialmente destacamos que o CPC/2015 gerou a figura do paradigma do laudo, na medida em que estabelece a parametrização deste relatório.

    Um paradigma é uma categoria pela qual se designa as realizações científicas que geram modelos que de modo mais ou menos explícito, orientam o desenvolvimento das pesquisas e perícias, na busca da solução para os problemas ou quesitos por elas suscitadas. Logo, é toda a forma de modelo para uma flexão, ou para a condução de uma solução.

    Em termos da ciência da contabilidade, um paradigma é um modelo colocado como uma representação de um padrão a ser seguido. É considerada a fluência (fluxo) de um pensamento. É um pressuposto de referencial. Nos ensinamentos de Platão é clara a ideia de modelo para um paradigma.

     O paradigma do laudo, está implícito no CPC/2015, art. 473, conforme segue cópia in verbis:

 

Art. 473.  O laudo pericial deverá conter:

I – a exposição do objeto da perícia;

II – a análise técnica ou científica realizada pelo perito;

III – a indicação do método utilizado, esclarecendo-o e demonstrando ser predominantemente aceito pelos especialistas da área do conhecimento da qual se originou;

IV – resposta conclusiva a todos os quesitos apresentados pelo juiz, pelas partes e pelo órgão do Ministério Público.

  • 1o No laudo, o perito deve apresentar sua fundamentação em linguagem simples e com coerência lógica, indicando como alcançou suas conclusões.
  • 2o É vedado ao perito ultrapassar os limites de sua designação, bem como emitir opiniões pessoais que excedam o exame técnico ou científico do objeto da perícia.
  • 3o Para o desempenho de sua função, o perito e os assistentes técnicos podem valer-se de todos os meios necessários, ouvindo testemunhas, obtendo informações, solicitando documentos que estejam em poder da parte, de terceiros ou em repartições públicas, bem como instruir o laudo com planilhas, mapas, plantas, desenhos, fotografias ou outros elementos necessários ao esclarecimento do objeto da perícia.

 

    Os princípios essenciais e paradigmáticos do laudo, que representa o escopo deste artigo e um bom labor do perito são:

1) O Objeto da perícia

    O objeto da perícia são todos os fatos que dependem de análise técnica ou análise científica, por serem controvertidos, de interesse para a solução da demanda e relevantes, conforme apontados no processo, quando o juiz proferir o saneamento e a organização do processo, nos termos do art. 357 do CPC.

     Advertimos que os fatos notórios, os confessados, e os incontroversos, não são objeto de prova pericial.

    A exposição do objeto da perícia é determinada pelo condutor da demanda, é a matéria ou assunto da inspeção e pode consistir exclusivamente, em pontos controvertidos, tais como, análise das provas entranhadas aos autos, resposta dos quesitos. Sendo que estes pontos têm por objetivo demonstrar a verdade dos fatos ou atos alegados, verdade real, se for possível, se não, a verdade formal; aquilo sobre o qual incide um direito ou uma obrigação. O objeto da perícia é a causa determinante do laudo pericial.

2) A Análise técnica ou científica

     Segue o sentido dado pela doutrina[1] especializada:

    Uma análise científica, em um labor pericial, implica na descrição e explicação dos fenômenos, estabelecendo-se as relações entre os fenômenos. Logo, significa estabelecer uma conexão entre vários atos ou fatos, ou vários grupos de atos e fatos para se refletir sobre eles. Durante a análise, se for cabível, também se estabelece uma conexão com a doutrina pertinente à questão.

    Uma análise técnica é uma ferramenta utilizada em laboratórios de perícia para testes, onde o resultado da análise vai indicar se o teste deu positivo ou negativo para uma determinada situação, dentro de parâmetros técnicos previamente indicados e normalizados para aferir tanto um diagnóstico positivo como negativo. Como exemplo para um quesito “se o índice de liquidez seca é superior a R$1,00, aplica-se o quociente ou rácio de liquidez, e o perito verifica se o resultado da equação deu positivo ou negativo em relação à disponibilidade de um real para cada um real de dívida. Neste exemplo a análise técnica avalia a capacidade de pagamento, quando da paralisação de vendas, se é positiva, ou seja, se tem capacidade de pagamento igual ou superior a R$1,00. Uma análise técnica implica no uso de procedimento contábil positivado que exprime uma parametrização contábil.

    Na mesma doutrina lecionamos que:

Se existem dois tipos de conhecimentos: atribuir juízo analítico às significações de ordem formal enquadradas no domínio da política contábil e das fórmulas matemáticas e consequentemente lógicas é uma “análise técnica”, a partir de um conhecimento empírico. E atribuir juízo analítico enquadrado no domínio da ciência da contabilidade, a uma específica investigação, baseada em método científico e em laboratório, que considera, além das fórmulas matemáticas e lógicas, causas, efeitos, leis, teorias, teoremas e axiomas, aplicados a um determinado fenômeno, para se indagar e concluir pelas causas finais que é uma “análise científica”, a partir de um conhecimento científico. O desenvolvimento da proposição do débito e crédito, como uma teoria para se registrar e controlar os fenômenos patrimoniais é um exemplo de conhecimento científico que implicou em uma análise científica, já a aplicação hodiernamente e cotidiana do débito e crédito na escrituração contábil que inclusive pode ser automatizada, é um conhecimento técnico, logo, é uma técnica de escrituração, e a análise dos débitos e créditos, é uma análise técnica para o confronto da igualdade entre as origens e aplicações de recursos.

Enquanto cada tipo de conhecimento, técnico (política contábil) ou científico (ciência da contabilidade), permite uma conclusão das provas careadas aos autos, a filosofia contábil reúne todos os resultados das análises, quer seja técnica ou científica, para que os utentes do laudo ou do parecer alcancem as suas convicções.

3)  A utilização de método científico

    É de vital importância a indicação do método utilizado, devendo o perito, esclarecer e demonstrar ser este método, predominantemente aceito pelos especialistas da área do conhecimento da qual se originou. Cabe inicialmente, efetuar a distinção entre metodologia e método, conforme segue:

    A metodologia são os procedimentos de governar o espírito em um processo de investigação. Pode ser simplesmente: o estudo dos métodos das ciências ou dos conjuntos de tecnologias e procedimentos utilizados em uma pesquisa ou produção científica. O estudo dos métodos tem por finalidade única e absoluta, a escolha do método mais adequado ao caso.

    Um método científico é um programa de cunho científico que regula previamente uma série de estudos e procedimentos que se devem realizar em campo e em laboratório, apontando erros evitáveis, em vista de um resultado determinado. Adversário fulminante do empírico ou da prática, de atos sem inteligência ou sem juízo.

     Em nossa doutrina defendemos o método do raciocínio lógico contábil[2], o qual:

 

consiste em pesquisar e decompor as partes que compõem um fenômeno para se conhecer o todo, considerando que a doutrina científica contábil evidencia a verdade real, teoria, teorema e princípios científicos do teorema da substância sobre a forma. Este é um método de investigação científica contábil ideal para a inspeção judicial ou extrajudicial.

 

    O sentido das etapas deste método são descritos na doutrina especializada e referenciada neste artigo.

    O método do raciocínio contábil deve ser prioritariamente utilizado, uma vez que a perícia responde aos quesitos formulados, procurando dar condições aos juízes e árbitros, bem como, aos patronos das partes para formularem suas convicções relativas à prova.

    Para a utilização do método do raciocínio lógico contábil é condição sine qua non que sejam também utilizados os procedimentos da pesquisa bibliográfica[3] e da categoria contábil[4].

 4) A fundamentação das respostas

    Para a categoria “fundamentação das respostas”, este artigo se apoia na pronunciação técnica doutrinária, ou seja, uma norma técnica doutrinária de perícia contábil, que aponta e codifica um conjunto de regras técnicas-científicas de análise e que são os procedimentos, os quais compõem o doutrinarismo[5] pericial contábil.

    A fundamentação representa um conjunto coerente de ideias fundamentais, que dão subsídio as respostas. Estes procedimentos são transmitidos e ensinados em livros, laboratórios e escolas. O bom ensinamento doutrinário garante a qualidade de um labor pericial, pois indica o resultado da experiência e do estudo de pensadores-contadores-filósofos da perícia contábil, sobre as teorias e a interpretação dos atos e fatos patrimoniais e a avaliação de sua aplicação.

    Os procedimentos técnicos de perícia, na ciência da contabilidade são as análises técnicas ou científicas realizadas pelo perito-contador, em sintonia ao inciso II do art. 473 do CPC/2015. Estes procedimentos são obrigatórios para que as respostas sejam conclusivas para todos os quesitos apresentados pelo juiz, pelas partes e pelo Ministério Público. São os processos técnicos utilizados no laboratório de perícia para as verificações e inspeção de atos ou fatos patrimoniais, nas quais se utilizam além de método científico, outros procedimentos.

    Os procedimentos ou técnicas periciais que são oriundos da teoria pura da contabilidade, cuja descrição minuciosa consta da doutrina[6], são um gênero que se divide em tipos, tais como: amostra-testemunha, arbitramento, avaliação, certificação, circularização, exame, indagação, investigação, mensuração, observação e cronologia, entre outros, que são a base, ou seja, a fundamentação, para a ad solemnitatem da pronunciação pericial.

Considerações Finais:

    A partir do dia 18 de março de 2015, com a vigência do CPC e o  paradigma do laudo pericial, iniciou-se uma nova e melhor era para a perícia contábil no Brasil.

    A ampla defesa e o contraditório técnico são vitais para que se obtenha o devido processo legal e se faça a justiça, neste diapasão, temos o paradigma do laudo pericial e a especialização do perito.

    As respostas conclusivas a todos os quesitos apresentados pelo juiz, pelas partes e pelo órgão do Ministério Público, implica na fundamentação[7] da resposta, inclusive do não ou do sim, desta forma, todas as respostas devem ser indiscutíveis, contendo referência às razões da convicção do perito, tais como, a peças dos autos, uma teoria, teorema, princípios, a análise técnica ou científica realizada, e a fundamentação doutrinária quando cabível.

    E por derradeiro a adoção de um método científico, fundamentações e análises técnicas ou científicas, afastam o empírico e permite a exclusão de premissas não verdadeiras, afastando-se com isto eventuais falácias. O que impede que o perito venha a ultrapassar os limites de sua designação, bem como, emitir opiniões pessoais que excedam o exame técnico ou científico do objeto da perícia.

[1]     HOOG, Wilson A. Zappa. Prova Pericial Contábil – Teoria e Prática. 13. ed.   Curitiba: Juruá Editora, 2016.

[2]  Estudos completos, em relação ao método científico do raciocínio lógico contábil, podem ser obtidos em nossa obra: Teoria Pura da Contabilidade. Ciência e Filosofia. 3. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2013. Tomo 5.2. Raciocínio lógico, p.133/134.

[3]  O perito, ao realizar uma inspeção ou análise judicial sob a tutela de um método científico contábil, se apoia com predominância à doutrina em suas pesquisas bibliográficas.

[4]  Categoria contábil – implica em conceituar o vocabulário contábil, portanto, uma tecnologia usada na grafia científica contábil; representa cada um dos vocábulos contábeis, seguidos dos seus respectivos conceitos fundamentais, os quais devem obrigatoriamente, ficar estribados em um entendimento científico puro, interpretação de um professor-doutrinador apoiada na hermenêutica contábil, ou seja, uma opinião que confere unidade de juízo de realidade. Tais vocábulos ou verbetes, tidos como “categorias”, são usados para identificar um dos elementos ou a resenha de uma peça, produto contábil, ou para identificar e compreender as tecnologias e procedimentos consuetudinários ou morfológicos, como: teorias, enunciados, princípios e demais linguagens e termos científicos, principalmente os constantes em monografias, dissertações, teses, laudos, pareceres e relatórios de perícia, auditoria e consultoria, incluindo os eventuais jargões ou gírias profissionais. Este procedimento se faz necessário para desmistificar a ciência contábil perante a sociedade em geral e facilitar o entendimento dos termos contábeis, da informação prestada, da função da contabilidade e de seu objeto e objetivo pelos leigos e todos os tipos de usuários. (HOOG, Wilson Alberto Zappa, Moderno Dicionário Contábil – da Vanguarda à Retaguarda. 8. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2014, p. 101.)

[5]   HOOG, Wilson A. Zappa. Prova Pericial Contábil – Teoria e Prática. 13. ed.   Curitiba: Juruá Editora, 2016.

[6]  HOOG, Wilson A. Z. Prova Pericial Contábil – Teoria e Prática. 13. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2016.

[7]  Para efeito da fundamentação, vide regras contidas no CPC/2015, art. 473, “§ 1o No laudo, o perito deve apresentar sua fundamentação em linguagem simples e com coerência lógica, indicando como alcançou suas conclusões.

Publicado em 06/06/2016.