Haveres e Deveres do Sócio/Acionista Retirante

Prof. Me. Wilson Alberto Zappa Hoog[i]

    Segue uma sintaxe de uma reflexão que versa sobre a distinção científica contábil entre “haveres” e “deveres” de sócio/acionista, em caso de resolução da sociedade, em relação ao sócio/acionista[1] que se desliga.

   Uma reflexão sobre o tema, ainda que breve, é deveras importante para se evitar a cegueira científica por interpretações polissêmicas ou ambíguas que criam o negacionismo.

    A regra é simples, o sócio/acionista que se desliga, deixa de ser sócio e passa a ser credor da sociedade ou devedor. Surgindo com isto no âmbito da ciência da contabilidade a expressão: “apuração de haveres e/ou deveres”. Apuração de haveres e/ou deveres significa a precificação do montante correto a ser realizado, logo, liquidado.

   Um perito em contabilidade especializado em avaliações de quotas/ações, verificando a existência de haveres e/ou deveres vai definir, com critério científico, a parte que cabe ao sócio retirante.

   Haveres significa que o sócio/acionista que se retira tem um crédito a receber. Este crédito representa a participação do sócio no patrimônio líquido positivo, e em outros valores como adiantamentos para futuros aumento de capital e empréstimos.

    Deveres significa que o sócio/acionista que se retira tem um débito a pagar. Este débito pode ser em função de sua participação no patrimônio líquido a descoberto, prejuízos, perdas, atos de desvio de finalidade, ou existência de empréstimos, entre outras situações.

    Portanto, haveres ou deveres, dependem de uma avaliação por critério patrimonial de apuração de haveres, o que significa uma precificação pela via da métrica: balanço de determinação[2], nele incluído o principal ativo, o intangível fundo de comércio[3] internamente desenvolvido, cujo procedimento de valorimetria pode ser pelo método holístico, a utilização do balanço de determinação como critério de valorimetria, é uma questão pétrea, desde que os sócios não tenham pactuado no contrato social critério diverso.

      Se o sócio/acionista for devedor e credor ao mesmo tempo, estes valores se compensam entre si.

    As ilicitudes praticadas pelo sócio/acionista retirante, também compõem ajustes nos haveres e deveres. Entende-se por ilicitudes de um dos sócios, todos os atos que geram o dever de indenizar por perdas, danos e lucros cessantes, tais como: responsabilidade pelas deliberações infringentes do contrato social ou da lei; evasão fiscal; o fato de um sócio não realizar as contribuições estabelecidas no contrato social, art. 1.004 do CC/2002; a prática de negócios estranhos aos seus fins sociais que resultem em prejuízo; os atos de desvio de poder; fraudes contra os credores da sociedade; o recebimento ou pagamento de lucros ilícitos ou de lucros fictícios; pagamento de propinas a funcionários públicos; desvio de função; abuso da personalidade jurídica; abuso de direito; conflito de interesses; concorrência parasitária ou desleal; desvios de recursos; ou qualquer falta de diligência ou probidade, inclusive corrupção ativa e passiva e todas as formas de fraudes.

      É deveras importante realçar, que se o sócio/acionista retirante não praticou ilicitudes, mas os que ficam praticam. Deve ser registrado no balanço de determinação, estes efeitos, débito no ativo circulante referente a estes valores que a sociedade tem a receber dos sócios que ficam, e crédito no patrimônio líquido; esta posição tem respaldo na teoria ultra vires e na autonomia patrimonial ditada pelo princípio contábil da entidade. Portanto, o paradoxo é: existindo um patrimônio líquido a descoberto, pode surgir haveres, se existir atos de desvio de finalidade pelos sócios remanescentes; e um patrimônio líquido positivo, pode, em situações elencadas anteriormente, gerar débitos (deveres) do sócio que se retira; sendo haveres ou deveres, uma questão a ser resolvida pelo perito em contabilidade especializada no tema, pois não se pode afastar a hipótese de balanços maquiados com objetivo de falsear os haveres ou deveres, inclui-se neste paradoxo, o caixa dois com seus reflexos na precificação do fundo de comércio.

 

[1]   Citamos a categoria “acionista”, pois a ação de dissolução parcial pode ser objeto de sociedade anônima, nos termos do §2° do art. 599 do CPC/2015.

[2]  Estudos sobre o balanço de determinação pode ser encontrado na literatura específica: HOOG, Wilson A. Z. Balanço Especial ou de Determinação para Apuração de Haveres e Reembolso de Ações – Nos termos do art. 606 do CPC/2015, do art. 45 da Lei 6.404/1976 e do art. 1.031 da Lei 10.406/2002. 7. ed. Curitiba: Juruá, 2021.

[3]   Estudos sobre o fundo de comércio pode ser encontrado na literatura específica: HOOG, Wilson A. Z. Teoria Geral do Fundo de Comércio. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2021.

[i] Wilson A. Zappa Hoog é sócio do Laboratório de perícia forense arbitral Zappa Hoog & Petrenco, autor da teoria pura da contabilidade e suas teorias auxiliares, perito em contabilidade e mestre em direito, pesquisador, doutrinador, epistemólogo, com 48 livros publicados, sendo que alguns dos livros já atingiram a marca de 11 e de 16 edições.

 

REFERÊNCIAS:

BRASIL. Lei 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil.

_____. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.

HOOG, Wilson A. Z. Balanço Especial ou de Determinação para Apuração de Haveres e Reembolso de Ações – Nos termos do art. 606 do CPC/2015, do art. 45 da Lei 6.404/1976 e do art. 1.031 da Lei 10.406/2002. 7. ed. Curitiba: Juruá, 2021. 326 p.

_____. Teoria Geral do Fundo de Comércio. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2021. 300 p.

 

As reflexões contabilísticas servem de guia referencial para a criação de conceitos, teorias e valores científicos. É o ato ou efeito do espírito de um cientista filósofo de refletir sobre o conhecimento, coisas, atos e fatos, fenômenos, representações, ideias, paradigmas, paradoxos, paralogismos, sofismas, falácias, petições de princípios e hipóteses análogas.

 

Publicado em 22/04/2022.

Distinção entre Ágio e “Goodwill”/Fundo de Comércio

Prof. Me. Wilson Alberto Zappa Hoog[i]

 

        A distinção científica contábil entre “ágio” e “goodwill/fundo de comércio” é deveras importante para se evitar a cegueira científica por interpretações polissêmicas ou ambíguas.

     “Goodwill” é um bem, ativo intangível, adquirido ou desenvolvido internamente e identificável contabilmente de forma técnica e científica, pela sua capacidade de gerar benefícios econômicos ou ser um potencial presente de superlucro, em relação à remuneração do ativo operacional. Não raro, é o mais importante dos ativos de uma sociedade empresarial. É um bem intangível que possui preço, utilidade, propriedade identificável e vida útil, que pode ser determinada ou indeterminada, dependendo da vida útil do seu principal vetor.

     Os principais vetores do fundo de comércio são: os acervos técnicos, a carteira de freguês, o ponto, a marca, os contratos de concessão, distribuição, representação, entre outros. Os vetores não se confundem com ágio derivado de qualquer forma de expectativa, por ter, o goodwill, preço próprio determinável cientificamente pelo método de avaliação holístico, além de teste anual de recuperabilidade que é conhecido como: impairment of goodwill. O “goodwill” ou fundo de comércio, é o efeito da causa, negócios jurídicos, gerado por uma condição, que é o estabelecimento empresarial, cujo efeito é a capacidade de criar um superlucro.

     “Ágio” é uma palavra utilizada para identificar um preço pago a mais que o de mercado. É a diferença entre o preço de um bem e o valor pago por ele, cuja causa é o excesso de demanda em relação à oferta, e efeito, um sobrepreço.

      Acreditar na ilusão de que ágio é um termo comparável ou sinônimo de goodwill ou fundo de comércio, configura erro de cognição científica substancial, que somente o filósofo Platão consegue explicar, com base no seu mito da caverna[1].

      O mito ou “alegoria” da caverna, é um clássico da filosofia. A narrativa de Platão descreve no primeiro ato, a imagem de prisioneiros que desde o nascimento são acorrentados no interior de uma caverna, e somente podem olhar para uma parede iluminada por uma fogueira. Essa fogueira ilumina um palco onde coisas, como a sombra de um livro, entre outras coisas, são demonstrados como sendo o cotidiano e a verdade desta coisa. Pois as sombras dos livros são projetadas na parede, sendo estas sombras a única imagem que aqueles prisioneiros conseguem enxergar. Com o correr do tempo, são dados nomes a essas sombras de coisas, como livro. E a narrativa segue descrevendo em um segundo ato, que um destes prisioneiros é libertado das amarras e sai para vasculhar o interior da caverna, e não reconhece o livro. Pois ele via o que permitia a visão, que era a fogueira, e que na verdade, o livro real era na essência, diferente da sua sombra. E percebe que passou a vida inteira julgando apenas sombras e ilusões, desconhecendo a verdade, isto é, estando afastado da verdadeira realidade. Pois o prisioneiro acreditava que a sombra de um livro era de fato o livro, até que, por derradeiro, foi capaz de ver a verdade. Aristóteles[2], o pupilo de Platão, afirmou que a lógica nos capacita a descobrir erros e estabelecer a verdade; é a filosofia primeira.

       A premissa errada de que ágio, existe em função da hipótese de rentabilidade futura pela existência de goodwill, alegação genérica e imprecisa, é uma falácia por falta de evidência científica[3] e lógica.

     Chamar os conceitos, ágio e goodwill, à ordem científica contábil-jurídica, nos permite compreender porque um juízo não faz sua pronuncia determinando pagamento de “ágio” ou “deságio” em substituição à valorização ou desvalorização do intangível fundo de comércio, nas situações:

  • de rompimento de contrato de locação não residencial, 2º do  art. 51;  inciso II e §2º, §3º do art. 52, ambos da Lei  8.245/1991;
  • de haveres/deveres de sócio retirante[4] CPC/2015, art. 606, e reembolso de ações, cuja precificação ocorre nos termos da lei, balanço de determinação, entre outras situações;
  • como a preservação de intangíveis, na decretação da falência, Lei 11.101 de 2005, cujo objetivo desta lei, inciso I do art. 75, é o de preservar e otimizar a utilização produtiva dos bens intangíveis.

     E por derradeiro, à luz da teoria da essência sobre a forma, o goodwill que é uma palavra da língua inglesa, utilizada como sinônimo de aviamento de fundo de comércio, ou de “llave de negócio”, tido como sendo um atributo do estabelecimento empresarial, não se confunde com ágio derivado de qualquer forma de expectativa, por ter preço próprio determinável cientificamente pelo método de avaliação holístico, além de teste anual de recuperabilidade que é conhecido como: impairment of goodwill.

      O ativo intangível “goodwill” ou fundo de comércio, existe independentemente da existência de outro fenômeno, o ágio ou o deságio. Não existindo registro contábil de badwill. Deste modo um raciocínio lógico-contábil, minimiza as chances do viés de erro sistemático ou tendenciosidade de cognição, ou seja, evita o erro que distorce uma realidade patrimonial.

 

REFERÊNCIAS:

BRASIL. Lei 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil.

_____. Lei 8.245, de 18 de outubro de 1991. Dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a elas pertinentes.

_____. Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária.

 

[1] Mito da caverna, ou “alegoria da caverna” é uma metáfora do livro: “A República” do filósofo Platão. Através desta alegoria é possível conhecer a teoria platônica do conhecimento, ou seja, é possível captar a existência do mundo pelo viés dos sentidos, apartada do mundo inteligível do conhecido pelo viés da razão. Pois um investigador que acredita apenas em imagens criadas pela cultura, conceitos e informações que recebe durante a sua vida, vive na caverna, que simboliza o seu mundo, apenas conhece imagens que não representam a realidade. Só é possível ao investigador conhecer a realidade, quando se liberta destas influências pré-concebidas, ou seja, quando sai da caverna. Platão viveu na Grécia em Atenas (427 a.C. a 347 a.C.), foi um filósofo que teve como mentor, Sócrates, e como  pupilo, Aristóteles. Entre os seus legados filosóficos, destaca-se o mito da caverna, que é a base dos seus ensinos sobre a teoria das formas.

[2] Aristóteles, filósofo grego que viveu entre 384 a.C. a 322 a.C., foi aluno de Platão. Seus ensinamentos abrangem diversos assuntos, como a lógica, a metafísica e a retórica. Juntamente com Platão e Sócrates representaram uma referência de pensadores.

[3] Evidência científica – a força de uma evidência é baseada em teoria, teorema, princípios e leis científicas, como a teoria geral o fundo de comércio, que é uma teoria auxiliar da teoria pura da contabilidade. Não existe no mundo real, resultados das análises técnicas e científicas, que permitam admitir a pseudoconclusão de que ágio é algo análogo ou sinônimo de goodwill.

[4] Haveres/deveres de sócio retirante – a regra é, o sócio que se desliga, deixa de ser sócio e passa a ser credor da sociedade ou devedor, surgindo com isto a expressão: apuração de haveres e/ou deveres. Haveres e deveres significam a precificação do montante correto a ser realizado, logo, liquidado.  Haveres significa que o sócio que se retira tem um crédito a receber; e deveres significa que o sócio que se retira tem um débito a pagar. Tal precificação é pela via de balanço de determinação, o qual é considerado um critério patrimonial e não financeiro.

 

[i] Wilson A. Zappa Hoog é sócio do Laboratório de perícia forense arbitral Zappa Hoog & Petrenco, autor da teoria pura da contabilidade e suas teorias auxiliares, perito em contabilidade e mestre em direito, pesquisador, doutrinador, epistemólogo, com 46 livros publicados, sendo que alguns dos livros já atingiram a marca de 11 e de 16 edições.

 

As reflexões contabilísticas servem de guia referencial para a criação de conceitos, teorias e valores científicos. É o ato ou efeito do espírito de um cientista filósofo de refletir sobre o conhecimento, coisas, atos e fatos, fenômenos, representações, ideias, paradigmas, paradoxos, paralogismos, sofismas, falácias, petições de princípios e hipóteses análogas.

 

Publicado em 05/04/2022.