A Distinção entre o Compromisso do Advogado e o do Perito Assistente, Diante do Cliente e dos Julgadores
Prof. Me. Wilson Alberto Zappa Hoog[i]
Nesta reflexão estamos enfatizando a relação entre (compromisso do advogado, a uma defesa ética à luz da boa-fé) e a abominável apologia de inversão de valores, ou seja, a do perito assistente, que distancia-se do seu compromisso com a independência de juízo e a verdade científica dos fatos, e passa a defender os interesses econômicos do seu cliente que podem até ser difusos, fato que leva à perda da credibilidade dos peritos assistentes, onde de protagonistas da ciência, passam a ser uns meros figurantes sem credibilidade.
Um perito assistente deve pensar, e muito, sobre a hipótese de uma abordagem tolerante e aética e a ciência em relação aos eventuais interesses ilícitos do seu cliente, sejam estes interesses, por ignorância, desídia, má-fé, pois reconhecer como regra geral que a defesa do cliente é uma parte inerente da função do perito assistente indicado nos autos do processo, caracteriza uma falta de decoro e desrespeito do contador ao seu juramento no seu CRC, o que cria precedentes perigosos.
Isto posto, destacamos que é função:
- Do advogado: defender a Constituição da República Federativa do Brasil (observando o devido processo legal, o princípio do contraditório e o da ampla defesa), a ordem jurídica do Estado Democrático, os direitos humanos, a justiça social, a boa aplicação das leis, e a rápida administração da Justiça, em síntese, deve o advogado exercer a advocacia, na defesa dos interesses éticos do seu cliente, com dignidade e independência, em simetria aos seus deveres e prerrogativas profissionais, observando e prestigiando a ética;
- Do perito assistente: compromisso com a ética, com a ciência, com a moral, com a liberdade, com a verdade, com a justiça, ou seja, o compromisso é com a verdade científica e não com a defesa do cliente ou de seus interesses, econômicos, financeiros, políticos e comerciais, esse compromisso é vital para o restabelecimento e a manutenção de uma justiça justa, em um melhor ambiente para os julgadores apreciarem as provas. Ao ser contratado o perito assistente contador deve deixar bem claro que vai exercer a função com dedicação, responsabilidade e competência, respeitando as normas profissionais e éticas, adotando uma conduta profissional que observe sempre os meus deveres de cidadania, independentemente de crenças, raças ou ideologias, cuidando para que seu trabalho, diagnóstico dos elementos probantes, seja um instrumento de controle e orientação útil e eficaz para a realização da justiça, desenvolvimento da sociedade e o progresso do país, tal qual os seu juramento.
É lógico que não se permite aos peritos assistentes um comportamento tendencioso, vinculado ao conflito de interesse ou influência indevida de outros que afetem o julgamento profissional. Uma apologia ao erro ou a torpeza[1], são os atos, ou comportamentos das pessoas que fazem discurso para justificar, defender ou louvar a defesa do cliente a qualquer custo, como algo aceitável, os fins justificam os meios, sem se preocupar com as reais consequências desta apologia.
É lógico que os peritos não estão imunes ao erro, e sem embargos a este axioma, o perito assistente, assim como, o nomeado, tem compromisso com a verdade contábil, Teoria da Essência sobre a Forma, pois a manipulação de dados financeiros ou econômicos para diminuir ou inflar artificialmente direitos ou obrigações, os lucros ou o patrimônio líquido, é algo inaceitável, um ato doloso. Esse tipo de conduta, trocar o compromisso com a ciência pela defesa do cliente, é ilegítimo e prejudica o objetivo de uma prova pericial, revelar a verdade, minando a ética e a função do perito assistente, mesmo que a intenção possa ser a de uma ampla defesa ou de um contraditório técnico, pois ilusionismo, maquiagem da verdade ou qualquer fato patrimonial, cruza indevidamente a linha do código deontológico.
O que se espera dos peritos indicados é a observação do objeto da perícia[2] e do objetivo da perícia[3]. Portanto, o que realmente importa é saber a verdade científica à luz da Teoria Pura da Contabilidade e suas 9 teorias auxiliares.
E o efeito dessa conduta, a defesa do cliente, ou a defesa de comportamentos incorretos, tem diversos implicações negativas no contexto do julgamento da demanda, inclusive a hipótese de transformar a função de protagonista do perito assistente em um mero figurante sem credibilidade, que é um descrédito absoluto a sua função
E para além da apologia, a defesa do cliente por parte do perito assistente, e avante, pois está em direção ao infinito, temos o direito de pedir, o qual não deve ser exercido pelos peritos assistentes, e sim, pelos causídicos dos litigantes, pois trata-se de um elemento integrante da ampla defesa constitucional, que traz efeitos ao mérito da demanda, pois trata-se de um possível inconformismo, não sendo prerrogativa dos peritos assistentes. Se a Constituição da República Federativa do Brasil, brada, que a defesa é ampla, logo, não é restritiva, esta comporta o direito de espernear, sem embargos ao fato de que na matéria técnica científica contábil, a apologia (defesa de um erro) e o direito de espernear é algo abominável.
Um advogado pode e deve exercer a defesa ética dos interesses do seu cliente acerca das imputações que são feitas, sem qualquer ameaça à dignidade da justiça, repulsando a tese aposta a sua, desde que, seja ético, e não seja ofensivo a honra dos peritos, das partes, do Ministério Público, dos outros advogados, ou do julgador. Lembrando que a motivo dos peritos de não fazer defesa do cliente ou de adentrar na questão de mérito, decorre do fato de ser defeso aos peritos utilizar-se de coisas desprovidas de rigor científico, e de precisão técnica, pois o labor dos peritos tem foco na realidade fática das provas carreadas ao autos do processo, análise técnica e científica, art. 473 do CPC, pois somente atua quando o ponto controvertido estiver vinculado à ciência (quando a prova do fato depender de conhecimento técnico ou científico em simetria ao at. 156 do CPC), sendo que a função dos advogados diferencia-se dos peritos, pela hipótese do uso da estratégia da retórica no contraditório e na ampla defesa.
[1] TORPEZA – um ato torpe, pelo viés da ciência da contabilidade e jurídica, é um negócio viciado por fraude, desonesto e que se afasta da razoabilidade e da boa-fé. A boa-fé no mundo dos negócios é algo comutativo, pois trata-se de uma obrigação recíproca a que se obrigam todos de forma equivalente. E a torpeza não pode ser alegada ou aproveitada por quem tenha dado causa a ela. E em situações que envolvam processos judiciais ou arbitrais, quem deu causa à torpeza poderá ser condenado à litigância de má-fé. Portanto, um ato torpe é aquele praticado em sentido contrário à lei, à revelação da verdade real, à ética e à função social da propriedade. Ao agir com torpeza, a pessoa tem, ou deveria ter, conhecimento do mal que pode causar a outrem. Agindo assim, com desonestidade, fere os princípios da boa-fé, da probidade, que regem os negócios jurídicos. Não se admite em um Estado Democrático de Direito, a penalização de uma pessoa sem se comprovar a conduta torpe, o nexo de causalidade, e o resultado pretendido. É fato incontrovertido que a ordem jurídica não chancela exercício jurídico inadmissível (art. 187 do CC/2002), o que significa a obrigação da adoção de comportamento ético das partes de uma relação contratual, negócio jurídico, pontualmente no exercício de direitos, o parâmetro do princípio da boa-fé, o que veda o abuso de direito ou de poder, pois em todos os negócios jurídicos busca-se uma conduta baseada na confiança, na função social, na dignidade, na lealdade e com a intenção à boa-fé, confiança e informação correta, sem a abominável onerosidade excessiva para uma das partes em detrimento da outra. Aplicando-se nas relações jurídicas o princípio do venire contra factum proprium, princípio que veda o comportamento contraditório e imprevisto que pode causar surpresa na outra parte, portanto, temos o axioma de que “ninguém pode comportar-se contra seus próprios atos“. Por exemplo, um aumento ou diminuição da receita, pela via da violação da norma que disciplina a demonstração do resultado de um exercício, não pode ser usada posteriormente por quem busca se beneficiar da própria torpeza, neste exemplo, envolvendo a Demonstração do Resultado do Exercício (DRE) para a precificação de lucros cessantes, temos a situação de abuso verificado quando uma pessoa viola uma norma jurídica e, posteriormente, tenta tirar proveito desta violação em uma demanda judicial ou arbitral, porquanto, o dever de probidade deve ser observado em todas as fases, seja anterior ou posterior a do processo judicial ou arbitral. Outro exemplo, é a situação de passivo fictício ou de caixa dois em balanços para a apuração de haveres ou deveres, pois a sociedade que vai pagar haveres, não pode se beneficiar de balanço com passivos fictícios ou com omissão de caixa dois, pois tal fato gera enriquecimento sem causa, ou seja, quem busca indenização por lucro cessante, não pode pedir a inclusão de caixa dois, e quem vai pagar haveres de sócios, não pode exigir a precificação sem o caixa dois e seu efeito em fundo de comércio. HOOG, Wilson A. Zappa. Moderno Dicionário Contábil – da Retaguarda à Vanguarda – Contém os Conceitos das IFRS. Revista, Atualizada e Ampliada. 12. ed. Curitiba: Juruá, 2024.
[2] objeto da perícia – o objeto da perícia são todos os fatos que dependem de análise técnica ou análise científica, por serem controvertidos, de interesse para a solução da demanda e relevantes, conforme apontados no processo, quando o juiz proferir o saneamento e a organização do processo, nos termos do art. 357 do CPC/2015. Advertimos que os fatos notórios, os confessados, e os incontroversos, não são objeto de prova pericial. A exposição do objeto da perícia é determinada pelo condutor da demanda, é a matéria ou assunto da inspeção e pode consistir exclusivamente, em pontos controvertidos, tais como: análise das provas entranhadas aos autos, resposta dos quesitos. Sendo que estes pontos têm por objetivo demonstrar a verdade dos fatos ou atos alegados, verdade real, se for possível, se não, a verdade formal, aquilo sobre o qual incide um direito ou uma obrigação. O objeto da perícia é a causa determinante do laudo pericial. HOOG, Wilson A. Zappa. Moderno Dicionário Contábil – da Retaguarda à Vanguarda. – Contém os Conceitos das IFRS. Revista, Atualizada e Ampliada. 12. ed. Curitiba: Juruá, 2024.
[3] Objetivo da perícia contábil – objetivo da perícia é o de investigar, analisar aplicar os procedimentos de testabilidade e ceticismo, para emitir um parecer técnico-científico sobre determinado “objeto” que é o que esta sendo investigado; e os “objetivos” são o que se pretende conseguir, provar com os quesitos que devem ser respondidos pelo perito especializado no tema com lastro em sua análise/estudo efetuado em um laboratório de perícia forense-arbitral, em síntese, o objetivo é a finalidade/meta.
[i] Wilson A. Zappa Hoog é sócio do Laboratório de Perícia-forense arbitral Zappa Hoog & Petrenco, perito em contabilidade e mestre em direito, pesquisador, autor da Teoria Pura da Contabilidade e suas teorias auxiliares, doutrinador, epistemólogo, com 49 livros publicados, sendo que existe livro que já atingiram a marca da 17ª edição.
REFERÊNCIAS
BRASIL, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406compilada.htm, acesso em 28 de junho de 2024.
BRASIL, Lei 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm, acesso em 28 de junho de 2024.
HOOG, Wilson A. Zappa. Moderno Dicionário Contábil – da Retaguarda à Vanguarda. – Contém os Conceitos das IFRS. Revista, Atualizada e Ampliada. 12. ed. Curitiba: Juruá, 2024.
As reflexões contabilísticas servem de guia referencial para a criação de conceitos, teorias e valores científicos. É o ato ou efeito do espírito de um cientista filósofo de refletir sobre o conhecimento, coisas, atos e fatos, fenômenos, representações, ideias, paradigmas, paradoxos, paralogismos, sofismas, falácias, petições de princípios e hipóteses análogas.
Publicado em 02/01/2025.