A Doutrina e a Teoria Contábil, o seu Verdadeiro Sentido e Alcance

 

 Prof. Me. Wilson Alberto Zappa Hoog

 

Resumo:

     A pesquisa tem por fim contribuir com o esclarecimento, verdade real, em relação ao que é “doutrina contábil”, tendo como base o espírito da Resolução CFC 750/93, e os usos e costumes concomitantemente a Hermenêutica e a Epistemologia voltados à elaboração de um balanço especial para a apuração de haveres.

Palavras-chave: Doutrina contábil. Teoria contábil. Resolução CFC 750/93.

Desenvolvimento:

     Esta pesquisa está voltada a verdade real em relação à teoria, doutrinas e princípios voltados à elaboração de um balanço especial para a apuração de haveres. Motivo pelo qual, primeiramente, para se privilegiar a hermenêutica[1] e a epistemologia[2], ainda que esteja pacificado público e notório, trazemos o sentido e o alcance das categorias “doutrina” e “teoria”, conforme segue:

   DOUTRINA é a opinião ilibada, respeitada, sobre ciência, que lastreia posições ou interpretações privilegiadas. Tem força de solução de conflitos, diante de uma lacuna nas normas jurídicas positivadas, ou quando estas representarem antinomia. Na ciência jurídica e nos tribunais, tem sentido de suporte argumentativo para opinião de um perito, de uma defesa ou contestação, por ser o conjunto de princípios expostos nos livros de ciência, em que se firmam axiomas, teorias, teoremas, jurisprudência ou se fazem interpretações sobre a ciência jurídica ou contábil. Mas, em uma acepção mais genérica coloquial, quer significar as opiniões particulares, admitidas por um ou vários notáveis professores, a respeito de um ponto controvertido. Isto posto, a interpretação doutrinária consiste em uma análise crítica, via espancamento científico dos textos legais pelos professores doutrinadores, em artigos livros e teses em geral[3].

    Ao senador João Lyra Tavares falecido em 1930, é atribuído a criação do Dia da Contabilidade[4], em 1926, e foi aclamado Presidente do Supremo Conselho da Classe dos Contabilistas Brasileiros, e foi defensor do ensino contabilístico e da regulamentação dos profissionais práticos em Contabilidade, recebeu com justiça, o título de “Patrono da Contabilidade Brasileira”. Sendo atualmente o seu nome utilizado na maior condecoração emanada do Conselho Federal de Contabilidade: Medalha de Mérito Contábil “João Lyra”. Apesar desta importante contribuição a classe, João Lyra não é um doutrinador de contabilidade, e sim um político.

    TEORIA CONTÁBIL é um conhecimento, meramente racional. Pode ser uma opinião sistematizada com a possibilidade de um viés de utopia. Contudo, a teoria contábil consagrou-se como sendo um conjunto de conhecimentos não pueril que apresentam uma sistematização e credibilidade, e que se propõem a explicar elucidar ou interpretar um fenômeno ou acontecimentos que se oferecem à atividade da práxis da ciência. Cria um ponto de vista estritamente formal, em que não se encontram proposições contraditórias, nem nos axiomas, nem nos teoremas que deles se deduzem. A teoria deve alcançar o domínio filosófico e consiste em considerar esses fenômenos ou acontecimentos, não como a soma de elementos isolados para uma análise, mas como parte de uns conjuntos que constituem unidades autônomas de uma célula social. Manifesta um vínculo da práxis contabilística, além de possuir Leis próprias, donde resulta que o modo de ser de cada elemento depende da estrutura do conjunto e das Leis que o regem. Pode ser simplesmente um conjunto de princípios da ciência da contabilidade positivados pela doutrina, ou seja, opiniões sistematizadas por conjuntos de informações que têm por objeto o conhecimento científico, visando a explicar os seus condicionamentos, sejam eles tecnológicos, históricos, linguísticos ou sociais[5].

    Atribui-se a Pitágoras[6] a criação do termo “teoria”, do grego theoría (descrição racional oral ou escrita do conhecimento).

    Os princípios de contabilidade representam os fatores consuetudinários da política contábil e dizem como deve ser a contabilidade, estão na Resolução CFC 750/93[7], diferente dos princípios contábeis universais defendidos pelos doutrinadores, e representam a essência dos fatores originários e consuetudinários da ciência social, contabilidade, que descreve a contabilidade como ela é, verdade real, ou seja, a essência sobre a forma. E estas duas séries de princípios podem gerar um embate[8].

    Cabe destacar que em relação ao grafado na Resolução CFC 750/93, art. 2ºOs Princípios de Contabilidade representam a essência das doutrinas e teorias relativas à Ciência da Contabilidade, (…)” que se trata de uma alienação contabilística[9], pois uma coisa é a ciência da contabilidade e outra totalmente diferente é a política contábil. Até por uma questão de lógica, pois a doutrina assim como as teorias não é, e nunca foi produzida por normativos do CFC e sim por professores doutrinadores. Logo, são coisas totalmente distintas, e confundir isto, é algo temeroso por ser falacioso.

    Explicado o que vem a ser uma “teoria” e uma “doutrina”, lembramos que a escola brasileira de contabilidade é uma das mais avançadas e internacionalmente reconhecidas, e possui em seu escol vários expoentes que são os nossos doutrinadores, algumas que são os de base e já falecidos, que citamos em ordem aleatória por não ser um ranking dos vultos da contabilidade brasileira. Portanto, entre os falecidos, citamos apenas uma dezena de imortais da escola brasileira de contabilidade, os quais se tornaram imortais pela sua doutrina.

  1. O Prof. Dr. Antônio Lopes de Sá, autor de mais de 190 obras publicadas em vários países, por várias editoras, e em diversas línguas, sendo a sua principal contribuição a Teoria Neopatrimonial, a qual tem seguidores em vários países, e é tida com a teoria mais avançada que se tem notícia até os dias atuais.
  2. O Prof. Frederico Herremann Junior, que escreveu 10 livros, sua obra mais conhecida é: Contabilidade Superior – Teoria Econômica da Contabilidade.
  3. O Prof. Hilário Franco publicou vários artigos e livros, sua principal obra foi: Contabilidade Industrial, publicada pela Editora Atlas.
  4. O Prof. João Luiz dos Santos, sua principal obra foi: Perícia em Contabilidade Comercial, publicada pela Edições Financeiras, em 1961.
  5. O Prof. Olivio koliver, sua principal obra foi: Contabilidade de Custos, publicada pela Juruá Editora, em 2008.
  6. O Prof. Alberto Almada Rodrigues, sua obra mais conhecida é: Estrutura e Análise de Balanço, de 1958.
  7. O Prof. Americo Matehus Florentino, sua obra mais conhecida é: Teoria da Origem de Valores, de 1956.
  8. O Prof. Francisco D’ Àuria, o qual escreveu 23 livros, apresentou a teoria positiva da contabilidade, sendo a sua principal obra: Primeiros Princípios de Contabilidade Pura. E sem embargos a esta obra, este autor destacou-se em 1950 pela sua obra: Fundamentos Científicos da Contabilidade.
  9. O Prof. Carlos de Carvalho, entre os anos de 1902 e 1913 escreveu 4 importantes livros.
  10. O Prof. José Rojo Alonso, que se destacou por ser uma referência em perícia e arbitragem, publicou em 1975, o livro: Normas e Procedimentos de Perícia, e em coautoria com este signatário, o livro: Arbitragem uma Atividade para Contadores, em 2012, pela Juruá Editora.

    Naturalmente se destacam outros imortais, autores doutrinadores de importância internacional, que desenvolveram extraordinárias pesquisas, como os estudos sobre as partidas dobradas do Frei Luca Pacioli em sua obra: Summa de Arithmetica, Geometria Proportioni et Proportionilità, publicada em Veneza no ano de 1494; e o Patrimonialismo, no ano de 1923 por Vincenzo Masi (1893-1977) e, no ano de 1926, o Reditualismo por Gino Zappa (1879-1960); Jaime Lopes Amorim, ilustre pesquisador português que publicou duas importantes obras: Lições de Contabilidade Geral, 1929, e Digressão através do Vetusto Mundo da Contabilidade, 1968. Muitos são os autores estrangeiros que influenciaram com intensidade o desenvolvimento da contabilidade, porém, citamos e nos restringimos a apenas quatro por estarem diretamente ligados as nossas pesquisas, por referências bibliográficas, sem que isto, em hipótese alguma venha a diminuir outros importantes pesquisadores, e suas obras que também contribuíram para a existência de nossa “teoria pura da contabilidade”.

    Tanto os princípios de contabilidade, Resolução CFC, como os princípios contábeis universais da ciência da contabilidade, em conjunto com as NICs[10] e os fundamentos do direito contábil[11], são utilizados como um dos referentes[12] ao labor pericial para a manipulação dos dados no fabrico de relatos e do balanço especial. As técnicas, as teorias e os princípios, são as ferramentas postas à disposição do perito para o seu convencimento científico. Os procedimentos de perícia contábil visam fundamentar as conclusões que serão levadas ao laudo pericial contábil ou parecer pericial contábil, e abrangem, total ou parcialmente, segundo a natureza, as complexidades da matéria. E por isto, é que produzimos o livro: Balanço Especial para Apuração de Haveres e Reembolso de Ações, atualmente em sua 4ª edição, 2014, considerado a ciência da contabilidade e os princípios universais da contabilidade aplicadas na teoria pura da contabilidade, onde se têm catalogados 21 princípios contábeis, conforme segue:

  1. Coexistência;
  2. Competência;
  3. Consistência;
  4. Continuidade;
  5. Correção monetária;
  6. Custo histórico;
  7. Entidade;
  8. Expressão monetária;
  9. Extensão;
  10. Formalização;
  11. Homogeneidade;
  12. Integração;
  13. Integridade;
  14. Invariabilidade;
  15. Materialidade;
  16. Oportunidade;
  17. Periodicidade;
  18. Prudência;
  19. Qualificação-quantificação;
  20. Terminologias contábeis;
  21. Uniformidades contábeis;

   Existem outros princípios contábeis, específicos ao balanço como: o da instantaneidade, o da integridade, o da oportunidade, o da uniformidade ou da homogeneidade, o da sinceridade, e o da clareza.

    E por derradeiro, um regime principiológico, como o da ciência da contabilidade é deveras útil como referente doutrinário em um processo de valorimetria dos haveres, e dos detalhes da elaboração do balanço especial, geralmente com a intenção de construir uma linha de análise com independência e pautada na equidade.

     Este artigo foi inspirado e parafraseado a partir do nosso livro: Balanço Especial para Apuração de Haveres e Reembolso de Ações. 4. ed. Curitiba: Juruá, 2014. Tomo: 3.1.2 – Princípios Fundamentais ao Balanço Especial. p. 61 – 64.

[1] Hermenêutica – é um ramo da filosofia, e estuda a teoria da interpretação de textos escritos, especialmente nas áreas de ciências. Logo, se ocupa da análise de textos para uma explicação coerente de um conhecimento.

[2] Epistemologia – estuda a origem, a estrutura, os métodos e a validade do conhecimento, motivo pelo qual também é conhecida como teoria do conhecimento. A epistemologia (conjunto de conhecimentos que têm por objeto o conhecimento científico, visando a explicar os seus condicionamentos tecnológicos, históricos, sociais, lógicos, matemáticos, ou linguísticos).

[3] HOOG, Wilson Alberto Zappa. Moderno Dicionário Contábil: da Retaguarda à Vanguarda. 8. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2014. p. 180.

[4] O correto é o dia da Contabilidade, pois, em 1926 não existia sequer a figura do guarda-livros (Técnico em Contabilidade), a qual foi criada em 1931, e a de Contador somente em 1945.

[5] HOOG, Wilson Alberto Zappa. Moderno Dicionário Contábil: da Retaguarda à Vanguarda. 8. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2014. p. 389-390.

[6] Da redação. Pitágoras. Tudo é número. Ser Espírita, Curitiba, ano 5, n. 27, p. 38-39, 2014.

[7]   A observância dos Princípios de Contabilidade é obrigatória no exercício da profissão, e constitui condição de legitimidade das Normas Brasileiras de Contabilidade. Art. 3º. São Princípios de Contabilidade: o da entidade; o da continuidade; – o da oportunidade; o do registro pelo valor original; o da competência e o da prudência”. (Negrito do autor)

[8]   Embate entre a política e a ciência da contabilidade significa um encontro violento, por uma oposição ou resistência entre os valores da ciência da contabilidade, “como é o patrimônio” e os da política contábil, “como deve ser o patrimônio”.

[9] Alienação contabilística – representa as imputações nos operadores da contabilidade e dos utentes da contabilidade, de falsos conceitos, de fictícios critérios de valorimetria e tecnologias, de inventivos princípios e ilusórias teorias, teoremas e axiomas, e o que pode levar a erro de interpretação. Estas imputações podem ter origem em normas  infralegais, em sala de aula, e nem sempre representam ignorância contabilística, pois, quiçá, seja um juízo de conveniência dos imputadores que buscam semear falácias pela via de petições de princípios.

[10] NICs são as Normas Internacionais de Contabilidade que foram criadas pela International Accounting Standard Board – IASB, em inglês. É um conjunto de pronunciamentos contabilísticos internacionais publicados e revisados pelo IASB (International Accounting Standards Board). As IAS são tidas como uma base primária à contabilidade internacional. São adotadas por vários países exceto países com expressão econômica, de maior PIB, como os EUA. Muitos doutrinadores, como o Dr. Antonio Lopes de Sá, apontam as atrocidades destas normas, estas críticas podem ser vistas na doutrina de Sá. Normas Internacionais e Fraudes em Contabilidade 2. ed. 2014.

[11] Direito contábil – é a disciplina que cuida da política contábil e suas normas consuetudinárias e legais que disciplinam as relações dos lidadores, quer sejam usuários ou profissionais. Trata do conjunto de conhecimentos relativos a esta política contábil social, que tem por objeto a riqueza, e por objetivo o estudo desta riqueza, e por função a informação. Ou seja, é o conjunto das normas contabilísticas vigentes num país. Logo, uma área do conhecimento humano que sintetiza a influência recíproca entre o Direito e a Contabilidade. É, em sentido amplo, um conjunto de normas e princípios fundamentais que regulam a organização política social e econômica da iniciativa privada e do Estado, da forma de governo e suas atribuições limites e relações, além dos direitos individuais, intelectuais e os neoéticos. HOOG, Wilson Alberto Zappa. Moderno Dicionário Contábil: da Retaguarda à Vanguarda. 8. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2014. p. 174-175.

[12] Referente – é a situação contextual a que uma pesquisa acadêmica ou profissionalizante remete, ou seja, a explicação do objeto e produto desejado; demarca o alcance da abordagem de uma atividade científica, logo, o referente é o estribo da abordagem, que se vai dar ao tema de um labor científico. O referente é um forte indicativo para a “pesquisa bibliográfica”, e o uso da “categoria contábil”.

 

Publicado em 23/10/2014.