Lei 6.404/1976 e a Recuperabilidade de Ativos – Aplicada à Escrituração Contábil e às Demonstrações Contábeis

Prof. Me. Wilson Alberto Zappa Hoog.

Resumo:

     Demonstro uma breve análise sobre o reflexo da recuperabilidade de ativos, que é representada pela importância do conteúdo do plano de contas, especificamente nas contas de receitas. Pois em decorrência desta importância a escrituração deve ser reformulada a partir dos novos parâmetros oriundos da reforma na Lei 6.404/76.

     Nesta resumida apreciação, busco contribuir com a formação da melhor doutrina, que admite o direito contábil e a segurança jurídica em sua plenitude econômica financeira social e ambiental, a partir do sentido e alcance da categoria “recuperabilidade” por estar extrínseca nos novos procedimentos de valorimetria.

Palavra-chave: Recuperabilidade de ativos. Receitas. Lei 6.404/1976.

Desenvolvimento:

     O termo recuperabilidade surge da Lei 6.404/76, art. 183- § 3º. No balanço, os elementos do ativo serão avaliados segundo os seguintes critérios: § 3º  A companhia deverá efetuar, periodicamente, análise sobre a recuperação dos valores registrados no imobilizado e no intangível, a fim de que sejam: I – registradas as perdas de valor do capital aplicado quando houver decisão de interromper os empreendimentos ou atividades a que se destinavam ou quando comprovado que não poderão produzir resultados suficientes para recuperação desse valor; ou II – revisados e ajustados os critérios utilizados para determinação da vida útil econômica estimada e para cálculo da depreciação, exaustão e amortização. Incluído pela Lei nº 11.638, de 2007.

     A aferição da recuperabilidade é uma tecnologia, que avalia a eficiência do mecanismo de retorno de um capital investido em bens, comparando o tempo necessário para recuperar um bem em um determinado sistema “fluxo de caixa a valor presente”, no qual todo o custo retorna, efetivamente, ao caixa durante todo o período de vida útil do bem. Na prática, se não existir uma recuperabilidade isto pode gerar uma diminuição do ativo, por perda.

     A recuperação implica no efeito de recuperar-se, logo é a denominação que se dá ao fato de desinvestir ou receber os gastos efetuados, como se ressarcir de despesas, de custos, de capital investido em ativos não circulantes, adquirindo-se novamente o capital monetário inicial.

     A recuperabilidade se dá em decorrência da vida útil[1] e dos benefícios econômicos futuros gerados pelo ativo. Onde se encontra uma forma de perícia ou avaliação multidisciplinar, realizada por perito em contabilidade e por engenheiro.

     Para atender a regra de recuperabilidade, e informações gerenciais, as receitas devem compor as rendas por item de ativos ou por grupos de ativos, como exemplo: uma transportadora deve registrar a receita individualmente por cada tipo de veículo.

     As receitas de produtos podem ter um sentido amplo como: receita de venda de mercadorias, produtos e serviços, que representa os valores reconhecidos na contabilidade a esse título pelo regime de competência e incluídos na demonstração do resultado do período. Esta definição verte da Deliberação CVM n° 557/08. Porém defendo uma conta para cada item. E se possível e necessário para fins de uma melhor informação gerencial, as mercadorias, os produtos e serviços devem ser divididas por segmentos, linhas ou fabricantes, pois quanto maior forem os detalhes, mais precisas são as informações geradas pela escrituração.

   As contas de receitas da operação devem ser divididas por segmentos, para melhor atender as necessidades gerenciais, tais como:

  1. Receitas de produtos.
  2. Receitas de intermediação.
  3. Receitas de aluguel.
  4. Receitas de mercadorias.
  5. Receitas de serviços.

     Estas subcontas devem ainda identificar, filiais, departamentos e linhas de produtos e serviços.

   Outras receitas, tais como: as de factoring[2], de comissões, de agenciamento de mão de obra, de representação[3], de distribuição[4], de corretagem e etc. devem estar vinculadas ao objeto social, pois as receitas não vinculadas ao objeto social, para fins gerenciais são consideradas receitas não-operacionais.

    Com relação às receitas de serviços de intermediação, destaco que é o produto das vendas no ato de intervir, de uma empresa, dado pelo número de intermediação multiplicado pelo preço de venda. A receita de intermediação não engloba as parcelas que a célula social recebe ou venha a receber; embolso de um tomador do serviço ou comprador de produtos, cujo valor deve ser repassado a terceiros que são os prestadores de serviços ou os alienantes dos bens. Tais importâncias configuram meros ingressos financeiros, os quais não representam receita, na medida em que não são incorporados ao patrimônio do intermediador. Logo, não pode compor a base de cálculo de tributos ou contribuições sociais. O conceito de receita não significa o conjunto dos embolsos ou encaixes que venham a ocorrer no curso das atividades, pois estes ingressos se revestem de distintos fundamentos e origens, sujeitos à apreciação própria. As entradas em caixa, quando não se caracterizam como fatores de remuneração de atividade econômica desenvolvida, objeto social, não servem de parâmetros para a adequada identificação da contrapartida que o preço de um serviço ou bem deve representar. Como exemplo da não inclusão na categoria receita de intermediação, temos os valores repassados a uma célula social, para a satisfação de despesas ocorridas ou realizadas por conta e ordem de terceiros, ou para pagamento aos efetivos prestadores ou vendedores de serviços ou produtos, por esta célula social apenas intermediado. Logo, constituem a receita de intermediação os valores recebidos ou a receber, relativos à remuneração da intermediação, ou seja, a parcela que se caracteriza como fator de remuneração de atividade econômica desenvolvida, objeto social, do intermediador. Outro exemplo de intermediação é o caso de agência de turismo. Não se pode incluir na receita, a hospedagem ou o transporte, que são pagos a terceiros, mas apenas, a comissão pela intermediação. Este é o sentido do entendimento do Tribunal de Alçada de São Paulo: “Preço do serviço ou receita bruta da agência de turismo é o que corresponde à sua parte, àquilo que efetivamente recebe, como as comissões junto a hotéis e transportadoras”[5]. Defendo que a tributação de ingressos financeiros, simples encaixe, importa em violação do princípio constitucional da capacidade contributiva (art. 145, § 1º) e, configura verdadeiro confisco, em afronta ao art. 150, inc. IV da Constituição. Este é o sentido dado pela a Súmula 182 do antigo Tribunal Federal de Recursos: “É ilegítimo o lançamento do imposto de renda arbitrado com base apenas em extratos ou depósitos bancários”.

    Este é um dos exemplos encontrados no processo de conversão e melhoramento do padrão contábil brasileiro que tem como referente às normas internacionais de contabilidade. Entre as dificuldades para o processo de convergência avultam os aspectos culturais e o de formação dos contadores. Muitos são as alterações que remetem o profissional da contabilidade a um processo imediato de estudo e pesquisa.

[1]  VIDA ÚTIL – é o período de tempo durante o qual se espera que um ativo seja utilizado para uma atividade “empresa”. Pode ser também, a quantia de produção ou unidades semelhantes que se espera que sejam obtidas de um ativo durante o processo regular de fabricação de bem ou de prestação de serviços. A vida útil pode ser influenciada de forma relevante por uma rápida superação de tecnologia de máquinas, equipamentos, legislação ambiental, procedimentos e fabricação, inclusive alterações de tipos de matéria prima ou insumo. Os ativos intangíveis podem ter uma vida útil definida ou indefinida. Se for definida, a duração dessa vida útil está ligada ao número de produção ou de unidades similares constituintes ou dos anos de benefícios econômico, social ou ambiental esperado. Entretanto, um ativo intangível pode ter uma vida útil indefinida quando não houver limite previsível para o período durante o qual se espera que o ativo gere, resultado econômico ou, pelo menos fluxos de caixa líquidos positivos. Mais detalhes sobre o sentido e alcance ver as deliberações: CVM n° 554/08, CVM n° 553/08, CVM n° 527/07.

[2] FACTORING – operação comercial pela qual uma azienda produtora de bens ou serviços transfere seus créditos a receber, resultante de vendas a terceiros, a uma empresa (atividade) de fomento mercantil, que assume as despesas de cobrança e os riscos de não-pagamento.

 [3] CONTRATO DE REPRESENTAÇÃO COMERCIAL – é toda espécie de serviço de representar um preponente, ou seja, representa quem o constitui, em seu nome, por sua conta e sob sua dependência econômica, para ocupar-se dos negócios relativos à “atividades fins” do “exercício da empresa”, negócios mercantis. Pode ser contratada mediante retribuição fixa ou variável e calculada sobre o valor total das mercadorias. E executado por autônomo, pessoa física, o empresário, ou por uma sociedade empresária, registrada no Conselho Regional de Representantes, como, por exemplo: serviço de representação de um bem destinado à alienação, ou que constituem produtos ou artigos da indústria ou comércio da empresa. E está regulada pela Lei 4.886/65. O direito do representante de receber as comissões é constituído somente após o recebimento do produto de sua venda pelo representado, nos termos do art. 32 da Lei 4.886/65. E a forma de pagamento da retribuição segue os termos da Lei 4.886/65 e as normas do Conselho Regional de Representação Comercial (CORE).

[4] CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO – o codex civilis pátrio, não resolveu todas as dúvidas sobre a caracterização, bem como, o conceito e sentido prático da distribuição. É possível encontrar-se duas interpretações que podem englobar: 1-) As promoções ou agenciamento de pedidos em favor do proponente distribuído, com o respectivo recebimento de remuneração pelos negócios realizados. Logo, tem-se a figura costumeira da aproximação do comprador e vendedor, realizada por um agente intermediário distribuidor, que é contratado para encontrar freguês dispostos a adquirir os produtos ou serviços do proponente distribuído. 2-) A compra dos produtos do produtor distribuído para posterior revenda, atividade realizada portanto em nome próprio e por conta e risco do distribuidor sendo que nesta hipótese, o lucro do distribuidor resulta da diferença entre, a soma do preço de compra custo, despesas, tributos  e contribuições sociais, com o preço das venda dos produtos distribuídos. Sendo mais intensa, a primeira suposição, que sinaliza para a hipótese mais provável, de ser um simples agenciamento de negócios em favor do proponente distribuído, com a particularidade de que os produtos ou serviços objeto do agenciamento encontram-se na posse e não no domínio do agente distribuidor. O capítulo de agência e distribuição do CC/2002 tem este espírito, conclusão esta que verte de uma interpretação literal, desde o sentido da distribuição como um derivado ou proveniente da agência (art. 710) até as disposições sobre o direito do distribuidor à remuneração pelos negócios realizados em sua zona de atuação; independente da sua interferência na realização de vendas (art. 714) e direito à indenização no caso de diminuição no atendimento de suas propostas de vendas (art. 715). O que fortalece a tese jurídica contábil da existência apenas de um contrato de aproximação entre comprador e vendedor e nunca à aquisição de produtos para revenda por conta própria.

[5] 1º TACSP – 3ª Câm. – AC 363.954 – j. em 01.12.1986. Revista dos Tribunais 616/104.

Publicado em 03/09/2009.