A Dúvida e a Perícia Contábil na Arbitragem
Prof. Me. Wilson Alberto Zappa Hoog
Resumo:
O artigo apresenta de forma sucinta como uma dúvida resulta em perícia na arbitragem.
E com este referente, tratamos da dúvida, dos autos de inspeção contábil e do art. 22 da Lei de Arbitragem.
Palavras-chave: Dúvida na arbitragem. Perícia contábil. Autos de inspeção contábil.
Desenvolvimento:
Com base na teoria pura da contabilidade é possível visualizar a importância da dúvida em relação aos documentos que estão, ou deveriam estar, instruindo um procedimento arbitral.
A dúvida, logo toda forma de incerteza em relação às alegações postuladas na arbitragem, são motivos para a preparação dos autos de inspeção pericial. A função dos autos de inspeção pericial é fornecer ao árbitro, subsídio para a decisão do mérito da questão em análise. Devem ser parte destes autos de inspeção todas as conclusões e respostas fundamentadas pelo perito. Através da dúvida em relação aos atos e fatos narrados no procedimento arbitral é que se chega à verdade real.
A categoria dúvida, deriva do latim dubitare; é sentimento racional ou uma condição caracterizada pela ausência de certeza, que se opõe ao crédito ou a certeza. E representa uma desconfiança em relação a um ato ou fato contábil. E para que seja estabelecida a dúvida é necessário que haja uma noção de realidade do ato ou fato contábil em que existe a incerteza, e isto, noção da realidade, pode obstar a aceitação de um ato ou fato contábil como verdadeiro, pois estes, como postulado em um pedido ou contestação na arbitragem, podem estar incorretos ou incompletos, representando uma falácia por partirem de premissas falsas. A dúvida é o fator determinante da perícia, sendo necessário para a sua solução, aplicar métodos científicos, como o método do raciocínio contábil, que verte da teoria pura da contabilidade, que é reconhecidamente rigoroso para se eliminar a dúvida.
A dúvida constitui mais do que um conceito no âmbito da produção de provas contábeis, por ser um vasto tema de reflexão contabilística filosófica, uma vez que envolve em relação aos litigantes, o espanto, a ilusão, sentimento de medo, erros e até ignorância, entre outras coisas que, de algum modo, a sistematizam.
A dúvida, à luz da teoria filosófica contábil, sintetiza os três primeiros passos na busca da verdade patrimonial, que são: o espanto ou surpresa, o questionamento e a busca por respostas.
Um dos brocardos da arbitragem é que para o julgamento do mérito, o réu tenha o benefício da dúvida, esta possibilidade de se aplicar o benefício da dúvida decorre do § 2°, art. 21, da Lei de Arbitragem, pois o árbitro deve usar a lógica em seu livre convencimento. Sendo que na ausência de provas cabais, como a não apresentação de documentos e livros contábeis, a dúvida deve beneficiar o acusado. Assim, ele só será condenado se inexistir dúvida de que ele praticou o ato de que é acusado, ou que um ato realizado pelo autor implique responsabilidade por parte do acusado; na dúvida, absolve-se o réu.
É desejável, em demandas que envolvam bens disponíveis, a aplicação da interpretação restritiva aos fatos efetivamente provados, em decorrência do prestígio da ampla defesa e do contraditório.
Somente quando o autor provar que o réu praticou uma transgressão ou conduta típica ilícita é que se admite a culpa, pois a acusação tem o ônus de alegar e provar o fato que pretende, seja o objetivo da convicção do árbitro ou do tribunal arbitral.
O ônus da prova das acusações cabe à acusação, enquanto que para a defesa admite-se que caberia provar as causas excludentes de antijuridicidade, motivo pelo qual, quando houver fatos marcados pela dúvida e não solucionados pela perícia, a absolvição do réu se faz necessária por uma questão de lógica e justiça, pois “a dúvida, falta de segurança contabilística, sobre os chamados fatos e materialidade contábil da acusação”, leva à improcedência de todo o tipo de pretensão punitiva. Não obstante a esta máxima, o réu pode ter uma participação ativa na produção de provas, até para se propor uma ação típica da litigância de má-fé, é por isso, que o réu sempre se beneficia da dúvida.
A prova pericial, ou seja, o regime determinado para a colheita das provas, assim como toda a instrução probatória da arbitragem, Lei 9.307/1996, está sendo tratada em um único artigo, o art. 22, que prevê a possibilidade de o árbitro ou tribunal arbitral determinar a realização de perícias ou outras provas que julgar necessárias, mediante requerimento das partes ou de ofício. Esse dispositivo se coaduna com o princípio da ampla defesa e com o do contraditório, portanto, o conteúdo dos autos de inspeção pericial guiará o convencimento do árbitro ou tribunal arbitral, uma vez que este vem instruindo a prova para que se efetive o julgamento do conflito.
O árbitro pode ordenar, a requerimento da parte ou de ofício, a exibição integral ou parcial dos livros contábeis[1] e dos documentos do arquivo, uma vez que os livros contábeis, que preencham os requisitos exigidos por lei, provam a favor ou contra seu signatário. Lembrando que a escrituração contábil é indivisível e os atos e fatos escriturados podem resultar em provas favoráveis ao interesse de seu signatário ou contrários, e ambos serão considerados em conjunto como unidade probante.
Como regra geral, salientamos que compete ao autor instruir a peça inicial quanto aos fatos constitutivos do seu direito, e ao réu, a resposta, com os documentos destinados a provar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Quando se tratar falsidade de documento ou de uma escrituração, o ônus da prova cabe à parte que arguir tal dúvida. E caso em que o autor não tenha os documentos necessários para se provar as alegações, hipótese em que estes estejam em poder do réu ou de terceiros, deve requerer na peça vestibular a sua exibição, inclusive por meio de medidas coercitivas, como previsto no § 4° do art. 22 da Lei de Arbitragem.
Sendo que a falta da apresentação de livros e documentos por uma das partes ou ambas, autoriza o árbitro a avaliar esse comportamento, extraindo dele as conclusões lógicas; em decorrência do comportamento da parte faltosa, pode o árbitro dispensar qualquer medida coercitiva contra a parte que desobedeceu à ordem de exibição, como previsto no § 2° do art. 22 da Lei de Arbitragem.
E com a instalação da perícia, inicia-se a elaboração dos autos de inspeção, do qual deverá ser dada vista e ciência aos peritos assistentes das partes.
No bojo da arbitragem, surge o conceito de “auto de inspeção”, que é a parte da arbitragem onde se registra a inspeção física, vistoria e exame realizados pelo perito. O auto de inspeção funciona como instrumento de controle da estrutura da prova pericial contábil, é onde se registra tudo aquilo que diz respeito aos elementos probantes, por ser o meio de verificação que visa possibilitar o contato direto do perito com a coisa a ser verificada, a fim de se apurar a verdade real com base no princípio da epiqueia contabilística.
O auto de inspeção representa a parte da arbitragem onde se avalia de forma circunscrita e sistemática as provas, identificando a veracidade das alegações e contestações, serve para se avaliar as provas como um todo de maneira sistemática. As conclusões destes autos servirão para motivar a decisão do árbitro ou do tribunal arbitral.
Toda pretensão que envolve bens disponíveis, seja do autor ou do réu, fundamenta-se em fatos patrimoniais cuja ocorrência pode ser controvertida, por isso a inspeção, além de ato processual instrutório da arbitragem, é um ato complexo que envolve conhecimento da ciência da contabilidade e da política contábil. As dúvidas quanto à veracidade dos fatos afirmados e relevantes pelos demandantes constituem os fatos controvertidos sobre os quais deve versar o labor do perito dentro das limitações ordenadas pelo árbitro ou tribunal arbitral. Porque será através dos autos de inspeção que será demonstrada a existência ou não, dos fatos alegados sobre os quais se fundamentam a defesa e acusação.
[1] Livro contábil – reunião de folhas, cosidas ou por qualquer outra forma presas por um dos lados, e montadas com capa flexível ou rígida, em que constem grafados, por um profissional de contabilidade, todos os atos ou fatos ligados as células sociais; e são identificadas pelo seu título e destinadas a conter informações em forma contábil, compondo o conjunto de uma escrituração. Podem ser livros obrigatórios ou facultativos.
Publicado em 25/06/2013.