Fundo de Comércio em Caso de Desapropriação. Valoração Via Pericia Judicial Contábil
Prof. Me. Wilson Alberto Zappa Hoog
Resumo:
O artigo apresenta a realidade em que se insere a figura do “fundo de comércio em caso de desapropriação”, sob uma perspectiva da teoria pura da contabilidade, bem como sua valoração, que deve ser ancorada em um raciocínio lógico-científico de peritos-contadores.
Palavras-chave: Fundo de comércio. Método holístico. Desapropriações. Fato do príncipe.
Desenvolvimento:
A hipótese de desapropriação por interesse social urbano é aquela executada pelo Poder Público Municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, e tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade, garantir o bem- estar de seus habitantes e que as propriedades atendam a sua função social. Esta indenização será feita com prévia e justa indenização em dinheiro.
A desapropriação de uma sociedade empresarial, ou do seu estabelecimento, é uma alienação compulsória de bens ao poder público, que depende de avaliação, para uma justa indenização da desapropriação, por ser isto um direito do expropriado. O art. 5º do Dec.-lei 3.365, de 1941, definiu o sentido e alcance da categoria “utilidade pública para fins de desapropriação”. A declaração de utilidade pública far-se-á por decreto do Presidente da República, Governador, Interventor ou Prefeito, por força do art. 6º, do mesmo Decreto-lei, sendo que no preço da desapropriação deve constar o valor do Fundo de comércio – goodwill, por ser este o espírito do art. 31: “Ficam sub-rogados no preço quaisquer ônus ou direitos que recaiam sobre o bem expropriado.”
A desapropriação gera a responsabilidade civil do ente público para uma indenização por danos, não somente por lucros cessantes ou relativas as instalações industriais ou comerciais, mais também ao fundo de comércio, pois deve considerar a atividade econômica. Esta indenização é pelos prejuízos causados ao particular, pela azienda pública, em decorrência da perda da propriedade, logo, cabe uma reparação integral, pois em caso contrário, frustrar-se-ia o princípio constitucional da justa indenização da propriedade. Desse modo, a indenização do valor do fundo de comércio, também atende o princípio do valor social do trabalho. Inclusive, tem um inquilino o direito ao ressarcimento do dano sofrido no seu fundo de comércio, em razão da desapropriação com a perda do lugar de seu comércio.
Esta perda pode ser parcial ou total. É parcial no caso do negócio, a “empresa,” funcionar em outro local, ou a desapropriação não alcançar as filiais, onde cabe pelo viés da ciência contábil uma indenização pelo rompimento de contratos de trabalho dos empregados e autônomos, e demais contratos, lucros cessantes e perdas por desmobilizações, além do fundo de comercial relativo e exclusivo do imóvel desapropriado. Na seqüência está sendo demonstrado o valor total do fundo de comércio e valores proporcional à parcela desapropriada.
Motivo pelo qual, é defensável a opinião contábil de que um juiz não deferirá a emissão provisória de uma posse, sem o prévio depósito do valor da justa indenização, nele incluído o valor do fundo de comércio apurado em laudo pericial elaborado por perito designado pela justiça, ou por parecer juntado a inicial ou na contestação, CPC, art. 427[1]. Portanto, para a posse, não basta o depósito do valor da indenização do imóvel, feito em favor do proprietário do imóvel; por ser vital e imprescindível também o depósito do valor do fundo de comércio, o qual poderá ser a favor do locatário ou do próprio proprietário do imóvel, caso este esteja explorando atividade empresarial no local.
As medidas econômicas corretivas ao fato do príncipe[2], para se obter um justo valor, considera-se além do fundo de comércio gerado principalmente pela aptidão do ponto comercial, o valor da terra e das edificações, o going value[3], o desmonte, o interesse[4] pela coisa que pode ser dividido em: i) valor das rendas e lucros cessantes e ii) por valor de afeição[5], o transporte, a reinstalação de maquinismos, o dano moral[6], as despesas com elaboração de laudo e contratação de peritos avaliadores, os juros compensatórios e moratórios e a correção monetária.
Salientamos que a mensuração do valor do fundo de comércio pelo método holístico com a inclusão do going value, decorre da epiquéia contabilística[7] para que a Justiça possa deliberar sobre os direitos postulados.
O valor do fundo de comércio, mensurado pelo método holístico, cujo critério de valoração consta da moderna literatura contábil[8] representa um resultado econômico futuro. É fruto ou atributo do conjunto de bens “estabelecimento, art. 1.142 do CC/2002’, que pode ser vendido, CC/2002, art. 95; ou desapropriado.
O método holístico por este signatário desenvolvido e apresentado na obra: Prova Pericial Contábil, teoria e pratica 8ª edição, Juruá, 2010, demonstra uma capacidade de predizer, se existi, o excesso de resultados positivos, logo o fundo de comércio, pois repetimos o experimento muitas vezes e confirmamos vários desfechos possíveis dentro das probabilidades previstas pelo método. Portanto, defendemos a aplicabilidade do método holístico como critério de valoração do fundo de comércio pela teoria pura da contablidade. Pois a maioria dos peritos contábeis com quem discutimos o método, se mostraram dispostos a aceitá-lo, precisamente porque coincide perfeitamente com os experimentos.
[1] O disposto no art. 427 do CPC, permite a juntada à peça primeira ou à contestação Pareceres Técnicos com opinião científica/contábil de forma elucidativa, a qual permite que o Juiz dispense as demais provas.
[2] FATO DO PRÍNCIPE – diz-se quando o próprio Estado, mediante ato lícito, como, por exemplo, uma desapropriação, ou quando modifica as condições de um contrato, provocando prejuízo a uma pessoa. O dito fato do príncipe é um ato do Estado, logo de forma genérica e não se dirige a uma pessoa específica, mas este ato, mesmo que por forma indireta ou reflexa pode ocasionar prejuízo a terceiros, pois o factum principis pode provocar uma paralisação de um negócio e consequentemente, por via automática, perda e danos, gerados pela imprevisibilidade do foto do príncipe.
[3] Em casos específicos de indenizações de fundo de comércio por fato do príncipe, pode surgir a figura do going value, que tem o sentido de indicar o valor da continuidade dos negócios pela sua perpetuidade. Ou seja, com o amparo no princípio contábil da continuidade. Logo tem o sentido de indicar uma série infinita, ou de duração muitíssimo longa, de fluxos de lucros dos negócios. Que deve compor o valor global estimado do negócio, logo no valor global estimado do negócio, temos o valor residual estimado do negócio, pós-período de mensuração do fundo de comércio. Portanto é o valor atribuído ao período que vai além do período de previsão do fundo de comércio, pela suposição de que o negócio continuará operando com as mesmas condições e sem investimentos novos. Este valor residual, continuidade, going value, é obtido pela divisão do valor presente do fundo de comércio do último ano da previsão, pela taxa anual de desconto, este é um complemento do método holístico de avaliação do fundo de comércio. E deve ser utilizado na valorimetria do fundo de comércio, para os casos de desapropriação, na hipótese de o negócio se tornar inexeqüível em outro local.
[4] Para se entender a categoria “interesse”, utilizamos como referência o Decreto-lei 3.365/41, art. 27, onde o juiz indicará na sentença os fatos que motivaram o seu convencimento e deverá atender, especialmente, (…) o interesse que deles aufere o proprietário. Pois o interesse pode ser um gênero de duas espécies, a primeira; o sentimento de zelo, simpatia e empenho e a segunda; toda a vantagem ou proveito econômico, dito como proventos ou receita que cessará para o expropriado.
[5] O valor de afeição é subjetivo, e compõem valores de ordem moral e ética, pois envolvem sentimento de apego e afeiçoamento. É uma relação que determina a agregação ou a conexão de pessoas a coisas. A perda do valor de afeição implica na perda de prestígios econômicos, sociais, que pode ser em maior ou menor grau, pois sempre vai depender, do que isto representa na convivência; e de seu valor na ambiência em que estava inserido, pois o prestigio cria uma superioridade pessoal baseada no bom êxito empresarial, e que é admitida pela maioria de um dado meio social. Como exemplo acadêmico de um valor de afeição temos: Um a desapropriação de imóvel urbano, onde a pessoa física, proprietária do imóvel, explora atividade comercial junto com a sua família, esta atividade foi criada pelos seu bisavôs, que foi mantida pelo seus avôs e ampliada pelos seus pais, e atualmente representa um local seguro de trabalho para os seus filhos e netos; logo a afeição decorre do negócio desenvolvido pela sua família.
[6] O dano moral é uma conseqüência do espanto, e da forte emoção de perda, e até desarticulações comerciais. Contudo o dinheiro ou valor equivalente em dinheiro, tem uma função de remir ou expiar o agente expropriador e de satisfação ao desapropriado, por dano quase sempre psicossomático que gera seqüelas. Entendemos que o dano moral deve compor o valor da indenização, por estar em sintonia ao princípio da justa indenização.
[7] EPIQUÉIA CONTABILÍSTICA – representa toda forma de interpretação razoável ou moderada de uma lei, ou de um direito postulado em juízo ou de um preceito da política contábil. Logo temos a equanimidade ou disposição de reconhecer o direito de todas as pessoas envolvidos em uma relação com imparcialidade. Logo, afastada toda e qualquer influência ou interesse, evitando-se excesso por uma interpretação extensiva viciada ou polissêmica, para prevalecer a eqüidade.
[8] HOOG, Wilson A. Z. Prova Pericial Contábil – Teoria e Prática. 8. ed. Curitiba: Juruá, 2010.
Este artigo tem como referente as obras: Fundo de Comércio. 2. ed. Curitiba: Juruá,2010. E Prova Pericial Contábil – Teoria e Prática. 8. ed. Curitiba: Juruá, 2010.
Publicado em 08/12/2010.