Implantação das IRFS nas Pequenas e Médias Empresas. Resolução CFC 1.255/2009.

Prof. Me. Wilson Alberto Zappa Hoog

  Resumo:

    O artigo demonstra um embate entre as IRFS e as regras de contabilidade do Código Civil brasileiro, notadamente nos critérios de avaliação e de demonstração do patrimônio. Este embate está aqui caracterizado por um breve comentário sobre a temerária implantação das normas internacionais de contabilidade nos registros contábeis das sociedades brasileiras empresárias de pequeno e médio porte, as quais representam 99% das entidades.

    Com uma visão ou realidade em que se inserem os profissionais da contabilidade, sob a perspectiva da Resolução CFC 1.255/09, e o seu efeito lex e erga omnes, frente ao Código Civil. Considerando para tal que debaixo do véu da modernidade e internacionalização da contabilidade brasileira, esconde-se uma apologia à desobediência civil, com consequências de responsabilidade civil e criminal.

 Palavras-chaves: Implantação das IRFS para as PME. Normas internacionais de Contabilidade. Resolução CFC 1.255/2009.

Desenvolvimento:

    A contabilidade das sociedades empresárias e simples, consideradas de pequeno e médio porte, logo 99% das entidades, está fortemente regulada pelo Código Civil brasileiro, sendo que a atribuição de legislar sobre isto, é de competência do poder legislativo, os políticos que nos representam. Sendo esta a vontade de soberania do povo brasileiro, nela incluídos os contadores. Esta vontade foi manifestada democraticamente pelas leis aprovadas pelo Poder Legislativo e sancionadas pelo Presidente da República.

   Sempre defendi que os contadores precisam participar da política, e eleger contadores, principalmente como deputados federais, somos meio milhão, e temos que ter voz ativa no Poder Legislativo.

       Alertamos para o fato de que a implantação das normas de contabilidade por parte do CFC está sendo imposta, a revelia do Código Civil, e que debaixo do véu da modernidade e internacionalização da contabilidade brasileira, esconde-se uma apologia a desobediência civil, com consequências de responsabilidade civil e criminal.

    As importantes resoluções do CFC são consideradas normas infralegais, e como tal, não podem ampliar ou restringirem direitos ou obrigações, inclusive o CFC é um órgão incompetente para revogar ou derrogar o Código Civil, pois para tal, quem tem competência é o Poder Legislativo.

    É fato notório que todos têm o direito Constitucional de se manifestar sobre o Código Civil, inclusive apontar eventuais falhas e necessidades de atualização, porém, mesmo não concordando, todos devem se subordinar a esta lei. Podendo, no entanto, realizar movimento junto aos políticos, para que sejam efetuadas alterações. É a liberdade de pensamento, de livre manifestação que deve ser exercida junto com o dever de cumprir a lei, que é o Código Civil, notadamente quanto às demonstrações contábeis e critérios de avaliações. Sendo que este signatário que é professor, por meio deste artigo, que é considerado uma crítica construtiva, está manifestando a sua opinião e instruindo os contadores, com base na liberdade de cátedra, que também é prestigiada pela Constituição da República Federativa do Brasil.

     A expressão “infralegal”, usada para tipificar as importantes e necessárias Resoluções do CFC, tem o sentido e alcance daquilo que é usado para designar todo ato normativo que se encontre em nível hierárquico inferior ao da lei em sentido formal, como os atos administrativos da CVM, do CFC, CREA, da SRF e de outros como, o Banco Central, o Conselho Monetário, a Secretaria de Segurança Pública, as prefeituras, as autarquias, as universidades públicas, as fundações, enfim as pessoas de direito público. Na administração pública um ato administrativo é o meio operante em que se concretiza o exercício da função administrativa. Logo é defeso ao ato administrativo, disposição que restringe um direito assegurado pela lei, ou imponha requisito para sua fruição de que a lei não prescreve, ou de qualquer modo venha a dificultar o seu exercício, ou impõe exigência ou penalidade não fundamentada na lei.

     Em resumo, os atos infralegais tais como as resoluções, as deliberações, os pareceres, as instruções normativas e etc., não podem criar deveres ou direitos diversos da lei hierarquicamente superior ou revogar normas jurídicas superiores, mas somente agregar a necessária implementação técnica em sentido formal, podendo agregar melhor detalhamento operacional, mas sem lhe deturpar a sua essência, validade ou aplicabilidade. Uma resolução, ou deliberação, que cria deveres ou obrigações não definidas na lei superior, sofre de vício da ilegalidade; pois os atos administrativos devem sempre observar o interesse público e o objetivo que a administração pública, pessoa de direito público, pretende alcançar com a prática do ato administrativo, sendo obrigatoriamente aquela que a lei institui de forma explícita ou implícita, não sendo admissível que o órgão público a substitua por outra. A finalidade deve ser sempre o interesse público. Pois a finalidade tem que ser a específica prevista em lei para aquele ato da administração pública seja eficaz e válido. Pois é nulo qualquer ato praticado visando exclusivamente o interesse privado, ou contrário ao ordenamento jurídico. Esta opinião resulta da segurança jurídica instalada no país.

    A Resolução 1.255/2009 do Conselho Federal de Contabilidade tenta tornar o referido CPC uma prática contábil e enuncia que as normas serão aplicadas a partir dos exercícios iniciados em 1º de janeiro de 2010. Apesar desta orientação, defendemos que o CFC, ainda que ao abrigo da Lei nº. 12.249/10, que deu ao CFC poderes de legislar sobre normas de contabilidade, este órgão CFC, não tem competência legislativa superior ao Congresso Nacional, logo não pode alterar ou revogar o Código Civil brasileiro, em especial a sua intenção ou ratio legis.

    E para efeito da política contábil brasileira, Decreto-lei 9.245/46 com as mudanças oriundas da Lei nº. 12.249/10, cabe ao CFC, a incumbência de regulamentar o plano de contas e o preparo das demonstrações contábeis, via resolução ou instrução normativa, desde que esta regulamentação seja voltada a uma interpretação técnica do CC/2002. Logo não pode aumentar ou restringir o espírito do CC/2002, e sim delineá-lo. Ou seja, cabe ao CFC, o ato de descrever de um modo sucinto; expondo em linhas gerais as contas ativas, passivas e de resultados, marcando os limites dos títulos das contas, bem como das suas funções e técnicas de funcionamentos, a fim de se viabilizar a elaboração da trípode contábil.

    Para a categoria contábil contemporânea trípode contábil, temos os elementos da prestação de contas. Do latim, tripodes, compreende o conjunto de três relatórios apresentados pelo administrador da célula social, para a aprovação de suas contas. Contempla três produtos contábeis básicos e fundamentais que registram a posição estática e dinâmica da riqueza, o seu resultado econômico e financeiro de forma contábil[1]. Tais demonstrativos foram consagrados pelas teorias: das partidas dobradas[2], e do rédito, o qual sintetiza o resumo, no período, das variações dos sistemas:

 1º) de resultado positivo, como receitas, ganhos e lucros, e de resultado negativo como despesas, perdas, custos e prejuízos;

 2º) do sistema patrimonial, origens, aplicações e mutações da riqueza durante um determinado período de tempo, normalmente um ano.

     A trípode contábil compreende três elementos mínimos e essenciais à prestação de contas anual; (CC/2002 art. 1.020), o trio contábil: balanço patrimonial, balanço de resultado econômico e o inventário; também exigido pelo art. 1.065 do CC/2002.

    Os Argumentos fáticos e jurídicos, aqui delineados, revelam que é com base nos artigos 1.020, 1.065, 1.179 1.187, 1.188 e 1.189 do Código Civil que o responsável técnico da escrituração deve basear-se para o preparo das demonstrações contábeis. Além de outros artigos, como os de números 1.183 ao 1.186, que tratam das regras da escrituração do livro diário, e do balancete.

    A não observação de tais normativos, pode, quiçá, levar o profissional de contabilidade, a responder por omissão, ato culposo, no desempenho de suas atribuições, sujeitando-se a responder pelos danos junto com o administrador, nos termos dos artigos, 1.177 e 1.178 do CC/2002.

    Sendo que o balanço patrimonial e o balanço de resultado econômico, assim como o inventário, elaborado nos termos do CC/2002 devem ser aprovados na reunião de sócios, se for menor que 10, ou aprovados por assembleia e o número de sócios for igual ou superior a 10.

    A Resolução 1.255/2009 do Conselho Federal de Contabilidade, com o devido respeito e vênia, representa um ato contrário à evolução doutrinária, já há muito tempo consagrada pela ciência, e pela escola brasileira de contabilidade, a título de exemplos, destacamos o item 2.26 que traz o conceito de despesa, citamos que uma coisa é a categoria “despesas” e outra totalmente distinta são os “custos”, e colocar tudo em uma vala comum, além de ignorância sem precedentes na história da contabilidade brasileira, representa um retrocesso e uma, grave, falta de fidelidade e de informação aos usuários. É um ato contrário ao princípio da terminologia contábil. Até porque o espírito da Lei Complementar 95/98, que se aplica por uma questão de lógica as Resoluções do CFC, impõe ao importante órgão CFC, o dever legislativo de que as resoluções devem ser claras e precisas, para se evitar interpretações polissêmicas ou ambíguas, que como é o caso do uso das categorias “custos” e “despesas” de forma indesejáveis.

    Lembramos que sempre fomos e continuamos a ser favoráveis e defensores das importantes Resoluções do CFC, para se evitar a indesejável anomia contabilística. Apenas estamos, por meio desta crítica, exclusivamente construtiva, contribuindo para o aperfeiçoamento da praticidade contábil, bem como demonstrando a necessidade de se respeitar a legislação em vigor.

    E por fim, este signatário defende a necessidade de se implantar normas contábeis eficazes, que resultem em um avanço da Escola Brasileira de Contabilidade, sem que com isto, exista uma flexibilização que possibilite a elaboração de balanços putativos e criativos, como os que resultaram na crise americana dos derivativos, baseada na festejada figura no justo valor e do custo atribuível. Esta posição bem como as orientações práticas para a elaboração do conjunto das demonstrações contábeis, consta do livro: Código Civil Especial para Contadores, 5ª edição 2.010, o qual foi revisto e atualizado. O referido livro está disponível para compra no endereço: www.jurua.com.br e será entregue no seu endereço.

[1] FORMA CONTÁBIL – A partir de 11.01.2003, a escrituração contábil tem como base as novas normas do Código Civil, isto é, “forma contábil”, que revogou o velho sistema do Código Comercial “forma mercantil”, com Balancetes Diários, Balanço Patrimonial, Balanço de Resultado Econômico e Inventário, sendo os três últimos, anuais, com exceção das Sociedades Anônimas. Essas continuarão a utilizar o sistema contábil americano (Lei 6.404/76, e instruções da CVM). Como forma contábil temos: o regime de competência obrigatório para o registro dos gastos, idioma nacional e moeda corrente, escrituração por ordem cronológica de dia, mês e ano, com individualização, clareza e caracterização do documento relativo ao exercício da atividade de empresário ou Sociedades Empresárias e Simples e ainda às atividades sem fins econômicos, como as Associações e Fundações, seguindo os termos da Resolução CFC 750/93, que tem como produtos gerenciais e societários os Balancetes Diários, escriturados em um livro próprio e serão efetuados diariamente, o que quer dizer, com lançamentos diários da folha de salários e provisão com férias e gratificação de Natal entre outros; CC/2002, art. 1.186. A inclusão da terminologia “forma contábil” implica a adoção dos fatores consuetudinários da ciência social, que estão positivados nas Resoluções do Conselho Federal de Contabilidade.A escrituração será feita diariamente, em idioma e moeda corrente nacionais e em forma contábil, por ordem cronológica de dia, mês e ano, sem intervalos em branco, nem entrelinhas, borrões, rasuras, emendas ou transportes para as margens, seguindo as normas do Direito Contábil, (Resoluções do CFC, Dec.-lei 486/69 e Decreto 64.567/69, que regula dispositivos do Dec.-lei 486/69). É permitido o uso de código de números ou abreviaturas (por exemplo: nosso pagamento conforme Nota Fiscal n…., emitida pela sociedade […] por “NP. – CF – NF…”) que constem de livro próprio, regularmente autenticado, conforme o gênero da sociedade (empresária ou simples). (Ver arts. 982, 983 e 1.150 do CC/2002). A fiscalização da Receita Federal dispensa este livro, desde que os códigos de números e abreviaturas sejam inseridos, no próprio livro diário, em fichas ou formulários contínuos, devidamente autenticados (PN CST 11/85). Para a escrituração individual dos bens do ativo permanente, devem ser seguidos os termos do art. 41 do Dec.-lei 1.598/77; os demais itens, para sociedades empresárias, nos termos do art. 186, incs. VI e VII, do Dec.-lei 7.661/45. Para mais detalhes sobre a obrigatoriedade da escrituração, ler os comentários ao art. 1.179 do CC/2002 e, a parte 6.5, sobre escrituração contábil, no livro: Prova Pericial Contábil. 8. ed. Curitiba: Juruá, 2010.

[2]TEORIA DAS PARTIDAS DOBRADAS – método baseado no fato de que, para cada débito temos um crédito e vice-versa, exposto pelo Frei Luca PACIOLO, no ano de 1494, na cidade de Veneza, Itália, até hoje amplamente aplicado em todo o mundo. Esta teoria foi escrita no livro Summa de Arithmetica, com 613 páginas. A teoria do rédito representa o resultado da eficiência da empresa, ou seja, objeto social, pelo seu estabelecimento, que pode ser o lucro ou prejuízo, confronto das rendas, custos e despesas. (Teoria esta estudada e citada por SÁ. História Geral e das Doutrinas da Contabilidade. São Paulo: Atlas, 1997, p. 112) O criador desta teoria é Gino ZAPPA, em Milão na Itália, no ano de 1927, no livro: II reddito di impresa – “O rédito da empresa”.

 

    Este artigo  tem como referente à implantação das normas de contabilidade por parte do CFC a revelia do Código Civil.

Publicado em 16/11/2010.