Perícia Contábil e as Questões Científico-filosóficas

Prof. Me. Wilson Alberto Zappa Hoog

 

Resumo:

     A pesquisa tem por fim contribuir com o esclarecimento de dúvidas técnicas, verdade real, em relação às questões científico-filosóficas atreladas a “doutrina contábil”, tendo como base a Hermenêutica e a Epistemologia voltados à solução de dúvidas, pois o enfrentamento por parte dos peritos das questões que envolvem ciência e filosofia é deverás importante para solução dos litígios tanto no âmbito da Justiça Estatal como na arbitragem.

Palavras-chave: Doutrina contábil. Perícia Contábil. Questões Científico-filosóficas.

Desenvolvimento:

     Esta pesquisa se propõe a revelar técnicas e métodos que possibilitem a elaboração de relatórios periciais mais planejados, com maior clareza e de fácil compreensão, alcançando, desta forma, o objetivo de informar aos utentes da Justiça os resultados decorrentes das inspeções realizadas. Além de demonstrar a importância do estudo das questões filosóficas na ambiência da ciência contábil, motivo pelo qual, primeiramente, para se privilegiar a hermenêutica[1] e a epistemologia[2], trazemos o sentido e o alcance das categorias “sofismo”, “paralogismo”, “paradoxo”, “doutrina” e “TEORIA contábil”, conforme segue:

    Sofismo – implica em fazer raciocínios capciosos, o sofismo na filosofia contábil é um raciocínio falso ou falácia, através do qual o sofista pretende defender algo falso e confundir quem o contradita. Não se deve confundir um sofismo com um paralogismo, pois, o sofismo procedem da má fé, os paralogismos, da ignorância. Para os peritos em contabilidade, é deveras importante para os peritos estudar os sofismas os paralogismos, e os paradoxos, para poder opinar sobre questões científico-contábeis, ou seja, todos os tipos de pensamentos que são ambíguos ou contrários às Leis do raciocínio lógico contábil, e, por essa razão, incorretos e ilegítimos à luz da teoria pura da contabilidade.

    Paralogismo [do gr. paralogismós.] – Indica um raciocínio involuntário que não é válido, e não é intencionalmente produzido para enganar. Caso seja voluntário o raciocínio falso, temos um sofisma.

     Paradoxo – Um paradoxo é uma afirmação com aparência de verdade que leva a uma contradição lógica, ou a uma declaração que contradiz a verdade comum, ou o simples censo comum. A identificação de um paradoxo contábil, baseado em conceitos lógicos e racionais auxilia o progresso da filosofia contábil. Portanto, um paradoxo é ou parece contrário à lógica, logo, pode parecer ser um contra senso, absurdo, ou disparate. Para se refletir, vejamos: o paradoxo contábil da perda eficaz, de Antônio Lopes de Sá[3]:

 

Pode parecer paradoxal afirmar que a perda é eficaz, mas, existem circunstâncias em que ela se transforma em um próprio investimento, quando o objetivo a ser alcançado é a vitalidade dos empreendimentos, ou seja, a economicidade deles. A necessidade de manter a estrutura, mantendo a clientela, pode transformar-se em fator de perda quando as vendas se operam ao custo ou abaixo dele em um determinado período, forçado por contingências do mercado.

    Outro importante paradoxo é o do fundo de comércio[4]:

Pois o fundo de comércio, bem imaterial auto desenvolvido pode ser o de “maior valor” entre os ativos, mas não estão reconhecidos no balanço patrimonial. Se for o “justo valor” o que se deve retratar o balanço (IAS 2.6 do IASB) que “justo” é este que está fora da realidade ou da verdade real materializada pela essência? Se o Código Civil de 2002 no seu artigo 1.188 obriga fidelidade em balanço para se demonstrar a “situação real da empresa e, atendidas as peculiaridades desta”, que fidelidade é essa que subtrai um valor que existe?

 

    DOUTRINA é a opinião ilibada, respeitada, sobre ciência, que lastreia posições ou interpretações privilegiadas. Tem força de solução de conflitos, diante de uma lacuna nas normas jurídicas positivadas, ou quando estas representarem antinomia. Na ciência jurídica e nos tribunais, tem sentido de suporte argumentativo, para opinião de um perito, de uma defesa ou contestação, por ser o conjunto de princípios expostos nos livros de ciência, em que se firmam axiomas, teorias, teoremas, jurisprudência ou se fazem interpretações sobre a ciência jurídica ou contábil. Mas, em uma acepção mais genérica coloquial, quer significar as opiniões particulares, admitidas por um ou vários notáveis professores, a respeito de um ponto controvertido. Isto posto, a interpretação doutrinária consiste em uma análise crítica, via espancamento científico dos textos legais pelos professores doutrinadores, em artigos livros e teses em geral[5].

     TEORIA CONTÁBIL é um conhecimento meramente racional. Pode ser uma opinião sistematizada com a possibilidade de um viés de utopia. Contudo, a teoria contábil consagrou-se como sendo um conjunto de conhecimentos não pueril que apresenta uma sistematização e credibilidade, e que se propõe a explicar, elucidar ou interpretar um fenômeno ou acontecimentos que se oferecem à atividade da práxis da ciência. Cria um ponto de vista estritamente formal, em que não se encontram proposições contraditórias, nem nos axiomas, nem nos teoremas que deles se deduzem. A teoria deve alcançar o domínio filosófico e consiste em considerar esses fenômenos ou acontecimentos, não como a soma de elementos isolados para uma análise, mas como parte de uns conjuntos que constituem unidades autônomas de uma célula social. Manifesta um vínculo da práxis contabilística, além de possuir leis próprias, onde resulta que o modo de ser de cada elemento depende da estrutura do conjunto e das leis que o regem. Pode ser simplesmente um conjunto de princípios da ciência da contabilidade positivados pela doutrina, ou seja, opiniões sistematizadas por conjuntos de informações que têm por objeto o conhecimento científico, visando a explicar os seus condicionamentos, sejam eles tecnológicos, históricos, linguísticos ou sociais[6].

    Atribui-se a Pitágoras[7] a criação do termo “teoria”, do grego theoría (descrição racional oral ou escrita do conhecimento).

    Os princípios de contabilidade representam os fatores consuetudinários da política contábil e dizem como deve ser a contabilidade, estão na Resolução CFC 750/93[8], diferente dos princípios contábeis universais defendidos pelos doutrinadores, e representam a essência dos fatores originários e consuetudinários da ciência social, contabilidade, que descreve a contabilidade como ela é, verdade real, ou seja, a essência sobre a forma. E estas duas séries de princípios podem gerar um embate[9].

   Cabe destacar que em relação ao grafado na Resolução CFC 750/93, art. 2ºOs Princípios de Contabilidade representam a essência das doutrinas e teorias relativas à Ciência da Contabilidade, (…)” que se trata de uma alienação contabilística[10], pois uma coisa é a ciência da contabilidade e outra totalmente diferente é a política contábil. Até por uma questão de lógica, pois a doutrina, assim como as teorias não é, e nunca foi produzida por normativos do CFC, e sim por professores doutrinadores. Logo, são coisas totalmente distintas, e confundir isto, é algo temeroso por ser falacioso.

    Explicado o que vem a ser uma “teoria” e uma “doutrina”, lembramos que a escola brasileira de contabilidade é uma das mais avançadas e internacionalmente reconhecidas, e possui em seu escol vários expoentes que são os nossos doutrinadores, algumas que são os de base e já falecidos, que citamos em ordem aleatória por não ser um ranking dos vultos da contabilidade brasileira. Portanto, citamos apenas uma dezena de doutrinadores da Escola Brasileira de Contabilidade, os quais se tornaram imortais pela sua doutrina.

  1. O Prof. Dr. Antônio Lopes de Sá.
  2. O Prof. Frederico Herremann Junior.
  3. O Prof. Hilário Franco.
  4. O Prof. João Luiz dos Santos.
  5. O Prof. Olivio Koliver.
  6. O Prof. Alberto Almada Rodrigues.
  7. O Prof. Americo Matehus Florentino.
  8. O Prof. Francisco D’ Àuria.
  9. O Prof. Carlos de Carvalho.
  10. O Prof. José Rojo Alonso.

    Naturalmente se destacam outros imortais, autores doutrinadores de importância internacional, que desenvolveram extraordinárias pesquisas.

    Pelo sentido e alcance dos termos aqui descritos é possível concluir pela relevância do estudo da ciência e da filosofia contábil para se isolar e identificar falácias, paralogismos, ou ações que visam única e exclusivamente tergevisar[11] ou apresentar uma interpretação ambígua, em relação à verdade científica.

  E por derradeiro, as questões contábeis filosóficas, assim como as métricas contábeis, são deveras importantes para que, se existir o direito postulado, este possa ser tutelado. Por este motivo é imprescindível que as questões científico-filosóficas sejam enfrentadas pelo auxiliar do Juiz, o perito, este é o espírito do art. 156 do CPC/2015.

[1]  Hermenêutica – é um ramo da filosofia e estuda a teoria da interpretação de textos escritos, especialmente nas áreas de ciências. Logo, se ocupa da análise de textos para uma explicação coerente de um conhecimento.

[2] Epistemologia – estuda a origem, a estrutura, os métodos e a validade do conhecimento, motivo pelo qual também é conhecida como teoria do conhecimento. A epistemologia (conjunto de conhecimentos que têm por objeto o conhecimento científico, visando a explicar os seus condicionamentos tecnológicos, históricos, sociais, lógicos, matemáticos ou linguísticos).

[3] SÁ, Antônio Lopes de. O paradoxo contábil da perda eficaz. Disponível em: <http://www.fiscosoft.com.br/a/23dc/o-paradoxo-contabil-da-perda-eficaz-antonio-lopes-de-sa#ixzz3HZQ6zknI> Acesso em: 29 de out. 2014.

[4]  Este paradoxo foi parafraseado, a partir do paradoxo do Prof. Dr. Antônio Lopes de Sá, denominado de: Reflexões sobre um paradoxo na amortização do aviamento. Disponível em: <http://www.classecontabil.com.br/artigos/reflexoes-sobre-um-paradoxo-na-amortizacao-do-aviamento> Acesso em: 29 de out. 2014.

[5]  HOOG, Wilson Alberto Zappa. Moderno Dicionário Contábil – da Retaguarda à Vanguarda. 8. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2014. p. 180.

[6] HOOG, Wilson Alberto Zappa. Moderno Dicionário Contábil – da Retaguarda à Vanguarda. 8. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2014. p. 389-390.

[7] Da redação. Pitágoras. Tudo é número. Ser Espírita, Curitiba, ano 5, n. 27, p. 38-39, 2014.

[8]   A observância dos Princípios de Contabilidade é obrigatória no exercício da profissão, e constitui condição de legitimidade das Normas Brasileiras de Contabilidade. Art. 3º. São Princípios de Contabilidade: I) o da ENTIDADE; II) o da CONTINUIDADE; III) o da OPORTUNIDADE; IV) o do REGISTRO PELO VALOR ORIGINAL; VI) o da COMPETÊNCIA; e VII) o da PRUDÊNCIA”. (Negrito do autor)

[9]   Embate entre a política e a ciência da contabilidade significa um encontro violento, por uma oposição ou resistência entre os valores da ciência da contabilidade, “como é o patrimônio” e o da política contábil, “como deve ser o patrimônio”.

[10] Alienação contabilística – representa as imputações nos operadores da contabilidade e dos utentes da contabilidade, de falsos conceitos, de fictícios critérios de valorimetria e tecnologias, de inventivos princípios e ilusórias teorias, teoremas e axiomas, e o que pode levar a erro de interpretação. Estas imputações podem ter origem em normas infralegais, em sala de aula, e nem sempre representam ignorância contabilística, pois, quiçá, seja um juízo de conveniência dos imputadores que buscam semear falácias pela via de petições de princípios.

[11] Tergiversar – para o ramo da perícia contábil, tem o sentido de falta de lealdade dos litigantes, que estão apresentando ou utilizando-se de evasivas; ou subterfúgios. É, portanto, uma apresentação, oral ou escrita, na qual a parte que tem o dever de informar, apenas ladeia os fatos sem abordá-los diretamente.

Publicado em 14/04/2015.